Lousada criou bolsa de cuidadores para cuidar de quem cuida

Câmara vai apoiar projecto da Santa Casa da Misericórdia que visa ter cuidadores “formais” a dar “folga” aos cuidadores informais por umas horas. Estão identificadas já 300 pessoas que podem beneficiar da medida no concelho, mas serão mais

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Quem é cuidador informal e tem a cargo uma pessoa com doença ou incapacidade sofre de exaustão física e psicológica, fica isolado da sociedade e, muitas vezes, menospreza a própria saúde.

A Câmara de Lousada e a Santa Casa da Misericórdia de Lousada assinaram, hoje, um protocolo para a criação de uma bolsa de cuidadores designada “Lousada Cuida”. A meta é ter cuidadores “formais” a substituir os cuidadores informais por algumas horas, dando-lhes algum descanso, permitindo que vão, por exemplo, a uma consulta ou dar um passeio.

“Cuidar em permanência de outro, com algum nível de dependência, requer disponibilidade, atenção permanente, esforço e readaptação do quotidiano, das vivências e das dinâmicas familiares. Esta mudança e exigência consistentes e continuadas no tempo podem conduzir à exaustão física, psicológica e social, comprometendo, a qualidade de vida do cuidador informal e, até mesmo, dos cuidados prestados”, lembra a autarquia de Lousada, realçando a importância desta medida.

O diagnóstico feito sinalizou 300 cuidadores informais que podem beneficiar desta medida, mas serão mais, admite a Santa Casa.

“Há uma senhora com mais de 80 anos que cuida de dois filhos com deficiência há mais de 50 anos a tempo inteiro e sem condições nenhumas. Há situações dramáticas”

Já desde há cerca de dois anos que a Santa Casa da Misericórdia de Lousada tem um Centro de Apoio ao Cuidador Informal. Um projecto que nasceu para ser mais ambicioso, com rectaguarda em termos de alojamento, mas que viu a candidatura recusada. Ainda assim, explicou o provedor da instituição, Bessa Machado, não baixaram os braços e passaram a prestar ajudar aos cuidadores informais para que obtenham os apoios a que tenham direito e ainda a dar apoio psicológico.

Ele próprio percebeu a importância de dar apoio a estas pessoas quando se viu no papel de cuidador, reconhece. “Não estamos despertos para as coisas enquanto não as conhecemos de perto. A partir do momento em que passei a ser também cuidador é que me apercebi da grande dificuldade que acarreta o cargo que não é remunerado, é pesadíssimo e a tempo inteiro. Eu tenho condição económica que me permite ter ajuda, mas mesmo assim estou com a minha esposa 16 a 18 horas por dia e percebo o grande desgaste que isso traz”, assumiu Bessa Machado.

Por isso, a instituição pôs pés ao caminho e começou a trabalhar com recursos próprios. “Temos identificados mais de 300 cuidadores no concelho, mas prevemos que seja ainda uma parte do total. Todos eles, uns em maior e outros em menor grau têm necessidades de apoio, muito particularmente na área psicológica”, referiu.

Para conseguirem chegar a mais gente, lançaram o repto à Câmara que terminou neste protocolo que vai permitir contratar uma pessoa, com formação, para substituir os cuidadores informais durante algumas horas. “Este será um primeiro passo, que consideramos pequeno, mas em função das necessidades iremos com certeza pedir para reforçar esse apoio”, adiantou o provedor, falando na insuficiência de respostas existentes no país. “Há uma senhora com mais de 80 anos que cuida de dois filhos com deficiência há mais de 50 anos a tempo inteiro e sem condições nenhumas. Há situações dramáticas”, reconheceu, dando este exemplo no concelho.

O serviço desta bolsa será gratuito para quem tem carências económicas e terá um custo simbólico para outros utentes. Poderá ainda ser criada uma bolsa de voluntários para prestar estes cuidados aos dependentes.

“Muitas das vezes o apoio é dado por familiares, com dedicação exclusiva e que menosprezam por completo a sua vida pessoal”

Para o presidente da Câmara de Lousada este é mais que “um simples protocolo”. É um passo no sentido da “solidariedade e humanismo”, atestou.

“Todos já tivemos contacto com situações graves de dependência, de pessoas sem ou com pouca autonomia e que precisam de cuidados quase permanentes ou permanentes. Muitas das vezes o apoio é dado por familiares, com dedicação exclusiva e que menosprezam por completo a sua vida pessoal. Nada sobra em termos de tempo próprio”, referiu Pedro Machado.

Para já este cuidador formal, que a Santa Casa vai contratar com o apoio de mil euros dado mensalmente pela autarquia, vai substituir os cuidadores informais por algumas horas, mas a ideia era ir mais além no futuro. “Para irem a uma consulta, mas também ao cabeleireiro ou dar um simples passeio, que é essencial em termos físicos e psíquicos. Se nada for feito serão os cuidadores a precisar de cuidados”, defendeu o autarca.

“Estou certo que esta área terá que ter os apoios do Estado reforçados, mas a ideia deste protocolo é que não se fique à espera, que se faça já alguma coisa. Estaremos disponíveis para dar um contributo maior se tal se vier a justificar”, garantiu.

Pedro Machado disse acreditar que o “grande desafio vai ser convencer as pessoas a deixar os dependentes nas mãos de um cuidador formal”. “O apego e dedicação é tão grande que acham às vezes que só eles próprios sabem fazer o que é preciso para dar apoio ao dependente”, reconhece.

Estas são pessoas que “vivem confinamentos de décadas”, admitiu.