A constituição de empresas municipais tem sido dos assuntos mais controversos na política local. Aparentemente, são criadas com fins muito generosos, mas acabam, quase sempre, por ser utilizadas para contornar alguns mecanismos de controlo da actividade dos municípios. Por exemplo, as empresas municipais podem lançar concursos de milhões de euros fugindo à vistoria da Inspecção-Geral da Administração Local e ao visto prévio do Tribunal de Contas. Podem contratar pessoal, sem que essas contratações contem para o número de efectivos da autarquia e, ao mesmo tempo, possibilitam o pagamento de favores a membros dos partidos. E as dívidas que vão acumulando não contam para a dívida do município, mesmo que o único accionista seja o próprio município.

Provavelmente, uma das empresas municipais mais polémicas em todo o país terá sido a PFR Invest, de Paços de Ferreira, que tinha sido criada pelo PSD e amontoava uma dívida superior a 50 milhões de euros. Quando o PS chegou ao poder, entendeu que não assumiria essa dívida e conseguiu que a empresa fosse declarada insolvente, abrindo um precedente único a nível nacional. Ora, se a empresa era 100 por cento propriedade do Estado, como poderia falir?

Concorde-se ou não com a decisão do presidente da Câmara Municipal, o certo é que a insolvência da PFR Invest foi uma decisão politica que lhe cabia e que só o tempo dirá se foi ou não acertada. O que não se compreende é a criação de uma nova empresa municipal naquele concelho.

Há duas semanas, Humberto Brito, a propósito da insolvência da PFR Invest e da dissolução da Gespaços, declarou, numa entrevista ao “Público”: “Nunca achei que as empresas municipais servissem para grande coisa”. No entanto, agora pretende criar uma nova empresa municipal que assuma a gestão do serviço de recolha de resíduos sólidos urbanos, até agora concessionado à Suma. Sendo perceptível que o concelho tem um péssimo serviço de recolha de lixo e limpeza urbana, pode compreender-se que Humberto Brito aproveite o fim da concessão deste serviço à Suma para passar a prestá-lo pelo próprio município. O que não se compreende é a necessidade de, para o efeito, criar uma nova empresa municipal.

A criação desta nova empresa não está livre de riscos. O primeiro é político: depois do discurso contra as empresas municipais, os munícipes não entenderão facilmente uma decisão em sentido contrário. O segundo tem que ver com a gestão da própria empresa, que, estando a ser criada pelo mesmo município que acabou de declarar insolvente uma outra empresa municipal, cria algumas incógnitas importantes: Quando esta empresa necessitar de financiamento para adquirir os camiões, carros, máquinas, etc., quem irá financiá-la? Que garantias serão dadas a um banco de que nas próximas eleições, caso mude a cor política, o próximo executivo não irá declarar insolvente a nova empresa?

Se Humberto Brito entende que consegue prestar um serviço à população com mais qualidade e com menores custos, é legítimo que seja o município a fazê-lo. Mas será que não o poderá fazer sem ter que recorrer ao obscuro mundo das empresas municipais e sem contradizer a conclusão que sobre o assunto ele mesmo tirou, publicamente, há tão pouco tempo?

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