A cada braçada um novo sonho pode estar mais perto. Quem sabe mais um título, mais um recorde ou mais um campeão. O rol de conquistas do Clube Aquático Pacense (CAP) é longo. Um palmarés tão vasto que, de cor, ninguém sabe quantos títulos serão. Sabem que são centenas, sobretudo regionais e nacionais, mas também alguns internacionais. Só a atleta de natação mais medalhada do clube já conseguiu mais de 300 títulos.

Mas mais do que títulos, este clube de Paços de Ferreira procura ensinar lições de vida e mostrar que, com esforço e dedicação, tudo se consegue.

Tem actualmente cerca de 170 atletas, divididos entre a natação pura, a natação adaptada, as águas abertas, os masters e o pólo aquático. Na Escola de Natação do Clube há mais 300 crianças e jovens. Alguns poderão vir a ser campeões, outros querem apenas aprender a nadar. Fazem-no numa das três escolas do país que tem a certificação máxima atribuída, o nível de “excelência”.

“A natação é se calhar o desporto que melhor reflecte o que estes jovens vão encontrar na vida adulta deles. Obriga a muita dedicação, a serem metódicos, organizados, a sacrificarem-se. Por vezes a lidar com a frustração de não atingir um objectivo, mas depois perceber que há sempre um novo objectivo, algo que podemos corrigir e mudar futuramente. É o cair e levantar. Mais do que a prática de uma modalidade é uma prática de vida e uma escola de vida para os nossos meninos”, garante Pedro Morais, coordenador técnico da Escola de Natação.

“Estamos perto dos 170 atletas divididos por estas cinco modalidades e depois temos à volta de 300 meninos a aprender a nadar”

As origens deste clube pacense remontam a 2001. É nessa altura que nasce integrado na empresa municipal de Gespaços. Aí cresceu e ganhou vários títulos, até que, em 2014, se optou por dar autonomia às modalidades competitivas, nomeadamente a natação e o pólo aquático, criando-se o Clube Aquático Pacense. A par disso, foi refundada a Escola de Natação que existia em Paços de Ferreira, que passou a ser coordenada pelo clube, havendo uma maior aproximação às modalidades competitivas.

Os objectivos mantiveram-se: “a promoção e divulgação das actividades desportivas aquáticas, nomeadamente a natação e o pólo aquático, e paralelamente promover o ensino e a aprendizagem da natação”, refere Pedro Morais.

“A primeira braçada competitiva do clube foi a 26 de Janeiro de 2002. Ao longo destes 17 anos tivemos um crescimento, quer ao nível de atletas e consequentemente ao nível de resultados, com títulos regionais, nacionais e títulos internacionais e presenças em selecções nacionais. E mesmo títulos internacionais, como aconteceu em 2012 com o Hugo Ribeiro, que foi campeão europeu, que foi um marco histórico no desporto em Paços de Ferreira e para nós, da Natação, também foi um momento muito gratificante”, sustenta o coordenador técnico da Escola de Natação.

A senda de sucessos continuou. Talvez por isso as contas são difíceis de fazer. “O clube tem centenas de títulos. A última contabilização que fizemos apontava para largas centenas de títulos regionais e de títulos nacionais”. Isto nas várias modalidades, a natação pura, a natação adaptada, as águas abertas, os masters e o pólo aquático.

Pedro Morais, que trabalha na piscina desde que abriu, há 18 anos, assistiu a tudo, primeiro como professor de natação e treinador e, desde há cinco anos, como coordenador da Escola de Natação do CAP.

Viu o clube crescer ano após ano. “Estamos perto dos 170 atletas divididos pelas cinco modalidades e depois temos à volta de 300 meninos a aprender a nadar connosco entre os cinco e os 12 anos”, descreve o coordenador técnico.

Com tantos atletas e alunos, coordenar os horários de todos na piscina nem sempre é fácil. Utilizam não só a Piscina Municipal de Paços de Ferreira, mas também a de Freamunde. Há aulas e treinos durante todo o dia. “Treinamos às vezes às 6h30 da manhã. Depois ao final da tarde, sábados de manhã, sábados à tarde, às vezes ao domingo de manhã”, dá como exemplo.

“Há sempre espaço para mais um título e para mais um campeão”

Apesar de terem títulos nacionais em todos os escalões, desde os infantis aos seniores, Pedro Morais garante que “há sempre espaço para mais um título e para mais um campeão”. “Esse é até um bocado o lema da escola de natação, que é vem nadar entre campeões”, sustenta. Nem todos precisam de seguir esse caminho. “Os meninos que demonstram mais capacidade e competências para a prática competitiva são convidados a integrar os grupos de competição. Há meninos que preferem continuar numa via mais formativa e de recriação e esses também têm lugar dentro do clube”, afirma.

Mesmo quando ganha títulos, admite, a natação é uma modalidade que fica “longe dos holofotes”.

“Não digo isto com tristeza ou com mágoa, é uma contestação de um facto. A natação nos últimos anos teve um crescimento extraordinário a nível nacional e neste momento é a segunda modalidade mais praticada em Portugal. O grande objectivo da Federação Portuguesa de Natação é atingir os 100 mil praticantes em modalidades aquáticas”, adianta.

Mas a falta de visibilidade, muitas vezes traduz-se em falta de apoios. “Como qualquer clube de modalidades ditas amadoras, que é o nosso caso, e com menor visibilidade, nós lutamos sempre com dificuldades para termos um equipamento de treino ou capacidade para nos deslocarmos para um campeonato nacional ou regional. Todos os apoios que vamos obtendo do concelho de Paços de Ferreira e de outras empresas de fora são sempre bem-vindos porque fazem a diferença”, garante o coordenador técnico.

Para o clube crescer e permitir que os atletas cheguem a outros patamares falta muita coisa, reconhece Pedro Morais. Por exemplo, uma maior conciliação entre a escola e o clube, para facilitar os horários dos treinos, já que os jovens o fazem muito cedo, antes das aulas, e ao final do dia, até tarde.

“A nossa escola de natação neste momento é uma das três escolas no país que é certificada com o nível máximo de certificação”

“Precisámos de continuar a investir ao nível da escola de natação. Fazê-la crescer. Nestes cinco anos de funcionamento fomos implementando um conjunto de projectos. Um deles, que foi pioneiro a nível nacional, tem a ver com a forma como organizamos toda a aprendizagem dos nossos alunos, que foi reconhecida através do sistema de certificação de qualidade da Federação portuguesa de Natação. A nossa escola de natação neste momento é uma das três escolas no país que é certificada com o nível máximo de certificação, que é o nível de excelência entre centenas de escolas. Para nós é um grande orgulho e também um reconhecimento do trabalho que tem sido feito”, descreve Pedro Morais.

A mudança passou por uma estruturação pedagógica e didáctica da escola de natação e pela criação de um sistema de recompensas sempre que é adquirida uma competência, registada numa caderneta. Uma forma de os jovens se sentirem motivados, de os pais acompanharem a evolução e de os técnicos perceberem em que patamar está o aluno e aquilo que ainda precisam de desenvolver.

“Foi um trabalho pioneiro feito aqui em Paços de Ferreira e que actualmente já está a ser um bocadinho expandido para todo o país. Temos outras escolas a nível nacional que nos contactam para saber como funciona a nossa metodologia e nós partilhamos essa experiência. Se as escolas de natação aqui ao lado crescerem nós também vamos crescer”, acredita Pedro Morais.

“Começar um clube do zero é o maior desafio que tive na minha carreira enquanto treinador”

Também no clube desde o início está Rudolfo Nunes, coordenador técnico da formação, natação pura, águas abertas, masters e natação adaptada.

“Ia a caminho do clube onde trabalhava, em Felgueiras, para renovar o contrato e recebi um telefone do coordenador da piscina de Paços de Ferreira da altura para passar cá. Fizeram-me uma proposta para vir trabalhar para aqui”, recorda. Aceitou. “Começar um clube do zero é o maior desafio que tive na minha carreira enquanto treinador”, resume. “Foi olhar para a piscina deserta e tentar enchê-la”, acrescenta Rudolfo Nunes.

Depois foi acompanhar o crescimento do clube e assistir aos títulos em todas as modalidades da natação. “Já tivemos recordistas nacionais em todas elas, menos nas águas abertas em que não há recordes nacionais. Já tivemos um campeão europeu de águas abertas”, lembra Rudolfo Nunes.

Quando se lhe pede que destaque um não hesita: “O maior título que tivemos na natação pura é sempre o primeiro, foi a Diana Ferreira, nos 200 costas. Nós éramos apelidados de ‘estoura putos’ porque como éramos uma equipa nova e começamos a ter resultados muito cedo as pessoas pensavam que tínhamos uma metodologia de trabalho um bocado acima daquilo que seria para aquelas idades”, recorda o técnico.

Nos últimos 17 anos foram vários campeões nacionais em todas as vertentes. “Nos masters já tivemos também mais de 100 títulos nacionais, uma coisa que as pessoas não têm bem noção”, comenta. “Nas águas abertas já tivemos títulos nacionais de cinco quilómetros, do António Bessa, dos 10 quilómetros pelo Hugo Ribeiro, que depois foi campeão nacional de masters dos três quilómetros, e na natação adaptada tivemos o Renato Silva, o primeiro nadador de natação adaptada aqui do clube, que foi campeão e recordista nacional na classe dele. Agora temos outro nadador, o Simão Rocha, que já este ano conseguiu dois títulos nacionais para o clube”, realça Rudolfo Nunes.

Ainda assim, o coordenador técnico e treinador gostava de ver o Clube Aquático Pacense ir ainda mais longe. “Gostava de ver a competição num patamar que ela nunca atingiu. Já tivemos além dos êxitos que já disse dois miúdos nos campeonatos da Europa, um de águas abertas, o Paulo Dias, e outra de natação pura desportiva, que foi a Inês Rocha, e gostava de continuar esse legado e não ficar por aqui. Só que aí depende das condições que temos no clube”, refere.

Felizmente, destaca, em Portugal tem havido mais apoios aos atletas de natação. “A Federação Portuguesa de Natação tem lançado iniciativas que nos permitem treinar ao nível que se treina lá fora. É preciso quem está interessado agarrar-se a esse projecto e lutar pelo que ambicionou”, adianta.

É que “andar na natação é fácil, agora praticar natação de alta competição não é tão fácil como parece”, garante Rudolfo Nunes. “Para ir a uns jogos olímpicos ou a uns campeonatos da Europa de natação não se paga, é preciso fazer um tempo limite e trabalhar. Esta é uma modalidade muito exigente, que exige muitas horas de treino, dentro e fora de água, e muito descanso”, explica. Descanso para os jovens atletas é a principal batalha do clube devido à dificuldade de conciliação com os horários escolares, assume. “É complicado, para não dizer quase impossível, cumprirem o que está planeado do princípio ao fim”, diz.

Rudolfo Nunes lamenta, no entanto, que a natação não seja valorizada no país. “Temos aqui ao lado o futebol e de certeza que a verba do futebol para uma época não é a nossa verba para 10”, sustenta.

“Preocupa-nos dar uma boa formação. Se conseguirmos também estar nas fases finais regionais e nacionais melhor ainda”

Do lado do pólo aquático as metas também têm sido cumpridas. “Esta é a quinta época que estou aqui. O objectivo era começar a desenvolver o pólo aquático neste clube. Este é um clube basicamente de formação. Esse é o grande objectivo que queremos manter, é captar atletas para os formar. No início havia poucos atletas, agora já estamos com 70 atletas, a nível de formação conseguimos ter todos os escalões, principalmente no masculino, no feminino é mais complicado arranjar atletas, mas estamos a conseguir”, resume Francisco Noronha, coordenador técnico do pólo aquático e treinador principal.

Apostando na formação, o Clube Aquático Pacense quer chegar a um grupo sénior forte, que de destaque na modalidade. Tem já todos os escalões, desde sub12, a sub14, sub16, sub18 e sub20. Estes últimos já competem na primeira divisão e conseguiram a manutenção. Em femininos, o clube conta com equipas de sub12 e sub14 mistas e uma equipa sénior, que também está na primeira divisão.

“Ainda não é um desporto muito conhecido. A minha opinião é que está a evoluir aos pouquinhos. Eles já tinham aqui familiaridade com a modalidade, mas é sempre complicado porque é preciso ter a base da natação”, aponta Francisco Noronha.

“Preocupa-nos dar uma boa formação. Se conseguirmos também estar nas fases finais regionais e nacionais melhor ainda”, afirma o treinador. Até porque, admite, os resultados ajudam a chamar mais atletas para a modalidade, algo que não é fácil.

E os resultados têm surgido. “Os sub18 e sub20 conseguiram sempre o titulo de campeão a nível regional. Só este ano é que não vão conseguir isso. E conseguiram estar sempre nas finais do nacional de formação”, descreve o técnico.

“É o primeiro ano que conseguimos estar a competir na primeira divisão masculina e conseguimos já a manutenção para a próxima época, o que foi um bom resultado. Estamos a falar de atletas de sub18 e aub20. Conseguimos ser campeões nacionais de sub17, há dois anos, no ano passado ficamos em segundo lugar, perdemos a penaltis. Este ano temos uma boa vista para os sub14, tanto regional como nacional, estou com uma boa equipa. Esperamos que consigam o primeiro lugar em ambas e estamos com o objectivo de todos os escalões se apurarem para os nacionais. Um dos objectivos já conseguimos, a nível sénior ir à final da Taça de Femininos, ficamos em segundo lugar”, elenca ainda.

A maior dificuldade, concorda Francisco Noronha, é gerir os horários. “Eles saem todos os dias às 22h30 da noite, jogam sábado e domingo, é sempre complicado. São atletas que estão no 11.º e 12.º ano. Os horários são sempre uma condicionante, mesmo para os atletas virem praticar a modalidade. Gostava de ter outras opções”, confessa.

É que para dar o salto a nível de resultados é preciso condições de treino, o que passa por mais horas de treino, dentro e fora de água. “Tanto a direcção como os pais ajudam muito a angariar fundos para que eles tenham condições melhores para treinar”, admite.  Defende ainda que tem de haver mais divulgação dos jogos realizados e dos títulos conquistados, assim como das competições em que participam as equipas de pólo aquático do CAP.

Inês Rocha: a atleta mais medalhada de sempre do clube

Se o clube não tem as contas feitas, Inês Rocha, a atleta mais medalhada de sempre na história do CAP, campeã nacional e recordista nacional dos 400 estilos de juvenis e juniores, não hesita quando se lhe pergunta quantos títulos já alcançou: 306. “Dizer quantos são de nacionais e regionais não sei. Mas sei que no total são 306 medalhas, desde individuais a estafetas, e também troféus, que são uns 20”, explica a jovem de 17 anos, natural de Paços de Ferreira.

No início a sua história confundir-se-á com a de centenas de outras crianças que já passaram pela escola do CAP. Foi aprender a nada aos quatro anos, na escola que o irmão já frequentava, e incentivada pela mãe. “No início não gostava muito”, reconhece. Era “cansativo”.

Mas Inês Rocha juntou-se depois à parte competitiva. Terá começado a entrar em campeonatos por volta dos cinco ou seis anos. O “bichinho” instalou-se e nunca mais parou. Desde as escolinhas aos seniores foi acumulando bons resultados, títulos e recordes. “Deixou de ser brincadeira. Comecei a levar mais a sério e a achar que se calhar podia ter um futuro nisto”, conta a jovem.

Guarda todas as medalhas e troféus com carinho, ainda que o espaço seja cada vez menor. “Sendo umas mais importantes do que outras todas têm por detrás uma história, todas têm um trabalho feito entre mim e os meus treinadores, algumas com momentos difíceis. Essas, se calhar, é que trazem um sentimento mais gratificante, porque foi um trabalho difícil. Teve de haver mais esforço, mas foi recompensado e está ali o título que consegui alcançar. Traz-me felicidade olhar para as medalhas”, assume Inês Rocha.Mas admite que há momentos que marcaram particularmente. “Sem dúvida o meu primeiro recorde nacional que foi em juvenil B, em piscina de 50, nos 400 estilos foi marcante. Mas aquele que marcou mesmo mais foi o de júnior de primeiro ano que eu fiz o recorde nacional e na mesma prova fiz a obtenção de mínimos para o Campeonato da Europa de Juniores”, salienta a pacense.

Foi em 2017 que a atleta do Clube Aquático Pacense bateu o recorde nacional juniores 16 nos 400 estilos nos Campeonatos Nacionais de Juvenis, Juniores e Absolutos em Coimbra 2017, garantindo o acesso ao campeonato europeu. A representar as cores da Selecção Nacional já esteve também noutras provas internacionais, como a Flanders Swimming Cup, um dos mais prestigiados torneios de natação do continente europeu que decorreu na Bélgica, em 2018.

“Gostava de participar em mais provas europeias”, não esconde. “Qualquer atleta de modalidades olímpicas tem como um dos grandes objectivos ir aos Jogos Olímpicos. E tendo os resultados que tenho, que são bastante satisfatórios, esse era o principal objectivo tanto para mim como para os meus treinadores. Mas antes dos Jogos Olímpicos uns europeus de absoluto, uns mundiais de absoluto são metas para tentar alcançar”, confessa Inês Rocha.

No clube desde os quatro anos, a jovem salienta a “relação de família que ali é criada”.

“Eu dou-me muito bem com os colegas de equipa e isso é fundamental para um treino, apesar de ser uma modalidade muito individual. A relação entre treinadores é muito boa e o clube tenta sempre apoiar-nos”, concluiu a atleta.