Política para totós: Da desfaçatez do pequeno burguês (em jeito de carta)

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Caro amigo,

ainda te lembras de, por esta altura, há dois anos, teres escrito aquela missiva que me dirigiste, esperançado, mas cheio de dúvidas, sobre a vitória dos representantes do PS à câmara municipal de Paredes? A par do teu contentamento, logo nessa altura, mostravas algumas reservas sobre o que efectivamente ia mudar depois de 24 anos de estagnação, e retrocesso, nalguns casos.

Temias, dizias tu, que podia não mudar nada porque os que estavam a chegar ao poder vinham da direita, combateram o PS durante os 24 anos em que o PSD foi poder em Paredes e só concorreram pelo PS, partido que tu representaste, porque nunca conseguiram candidatar-se pelo PSD e facilmente perceberam que, nessa altura, qualquer “boneco pintado de cor-de- rosa” ganhava as eleições.

Da minha parte, sem ingenuidade, dei-te a minha opinião: pior que os outros era impossível.

Peço-te perdão por só agora te responder mas precisava de algum tempo para confirmar as tuas reservas ou desmentir o meu optimismo.

Quero dizer-te agora, depois de celebrarmos o fim de tantas malfeitorias da governação laranja – se ainda te interessares pelo assunto- que, afinal e com muita tristeza minha, os teus receios se confirmam.

Nunca vi tanta importância parola transportada por “chauffeurs”, tantos doutores e engenheiros que isto do respeitinho é muito lindo seja em Paredes ou no nordeste brasileiro. Agora, até para te chegarem o microfone precisam de doutores. Literalmente e a sério. E aqueles concursos públicos que tanto criticavas, lembras-te? Olha, nem os concursos públicos passaram a ser mais transparentes nem os ajustes diretos diminuíram. Com algum azar ainda vais descobrir parentes dos velhos e novos socialistas que já se sentam nas cadeiras do poder só porque se “venderam” ao partido vencedor ou alguns arquitectos que criaram gabinetes uns dias antes de as obras estarem a concurso. Por falar nisso, desperta-se instantaneamente a minha curiosidade: de quem serão os gabinetes dos arquitectos das grandes e necessárias obras de requalificação das escolas de Rebordosa e Lordelo? Se for como no tempo do PSD é “cão grande”, como diz o povo. Mas, agora, que há mudança –dizem eles- será algum rafeiro?

Meu caro, acabaram-se as “cidades inteligentes”, mas em contraponto atiram-te “ o maior da tua aldeia”. Se os tiveres grandes ainda podes concorrer. Seria uma agradável surpresa, confesso!

E as notícias nos jornais? Tantas e tão habilidosas. E as fotografias? Aos milhares para fazerem de conta que fazem e para mostrarem que fazem o que já está feito porque, nestes dois anos, de obra feita, nicles! Isto para não falar de outras tantas fotografias que estão “escondidas” porque não há justificação para os milhares de euros gastos em jantaradas à custa do erário público. Antes faziam a campanha eleitoral com o dinheiro deles. Agora, pagamos todos. Antes eram as “presidências abertas”, agora são as “presidências participativas”. Tudo tão diferente, como vês!

E por lá continuam também – em muitos casos são os mesmos – aqueles que tão bem fizeram a si próprios em negócios tão mal explicados.

Não te vou falar, que isso é coisa de cuscos, de tantos salamaleques entre pessoas que se odeiam visceralmente. É que nem imaginas a destilaria de ódios e hipocrisia!

Vou concluir, mas vou ter de nos dizer: e tu? tanta passividade tua perante tantos espertos que passaram pelo poder. Tanta passividade nossa!

Dirás que eles é que decidiam, sobretudo os presidentes. Dirás que as oposições são figuras de retórica no poder local. E são!

Mas, e tu? na oposição, mas estiveste lá. Tu também aceitaste ser irrelevante. Tu também não quiseste perder o carro com “chauffeur”? tu, se por lá quisesses ter continuado, terias denunciado tanta parolice junta? Tanta falta de humildade e de sentido de serviço público?

Sabes, antes dizias que foram uns escuros 24 anos. Hoje, ainda só podes dizer: foram 26 negros anos!

Os meus votos de que estejas de boa saúde e, desta vez, não esperarei pela volta do correio. Ainda antes do natal havemos de degustar aquela cabidela de que tanto gostamos.

Um abraço carregado de saudades!