Um moloke é um caixote de lixo de grandes dimensões, semioculto no pavimento que recebe todo e qualquer tipo de lixo. Assim está Sobrado, uma vila do concelho de Valongo que alberga um aterro onde são enterrados variadíssimos tipos de lixo.

Foi preciso ser notícia fora do país para que o país desse a devida importância a um assunto que pela inércia “já começava a cheirar mal”.

Como é que no século XXI, onde a prioridade é preservar o planeta para que as atuais gerações e as futuras possam ter uma melhor qualidade de vida, alguém, em 2009, permitiu o licenciamento deste aterro? Um aterro que depois foi autorizado a receber mais de 400 tipos diferentes de resíduos.

Não se percebe, nem vou perder tempo a tentar perceber o que motivou essa instalação, e porque não foi logo recusado quando apresentaram a proposta para instalar este tipo de atividade, mas todos sabem que, o que lá se passa, não é do interesse da população e não acautela um direito fundamental na constituição que é o de ser tratado de forma igual. Não podemos aceitar que uma vila de Portugal receba lixo que outros países não querem. A população de Sobrado tem o mesmo direito à qualidade de ar e logo à qualidade de vida, que uma outra vila num qualquer ponto da Europa. Não podemos aceitar ser o caixote de lixo da Europa onde se deposita toda e qualquer porcaria.

O artigo 3 da Declaração Universal dos Direitos Humanos proclama que, “Todo o indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal”. Como é que a população de Sobrado pode sentir-se segura com um aterro onde o cheiro nauseabundo indicia um claro atentado ambiental? A população de Sobrado não terá o mesmo direito à vida que qualquer outra população? Direito a uma vida que não esteja tolhida pelo constante mau cheiro e pela constante ameaça à sua saúde?

É sabido que em 2019 este moloke gigante recebeu uma média de 300 toneladas de resíduos por dia. Um dado curioso mas muito relevante é que recebeu esta quantidade descomunal de lixo a preço de saldo. Sim, foi cobrado por cada tonelada 9€ quando a média europeia ronda os 80€ por tonelada. Em Sobrado para enterrar lixo e estamos a falar do fim da linha deste processo, cobramos cerca de 9€ quando outros países cobram 80€. É um claro convite a que outros países mandem para cá o lixo que produzem. Neste momento 30% do lixo vem de fora de Portugal, mas se nada se fizer e com a publicidade que tem sido feita, esta percentagem vai aumentar significativamente.

Saliento que neste aterro não é feito tratamento/valorização dos resíduos, mas sim a sua eliminação. Ao aterro chegam camiões com sacos cheios de lixo que são despejados diretamente para o buraco onde vão ser enterrados. O lixo que ali fica enterrado produz gases e lixiviados que resultam da decomposição dos resíduos, que, se não tiverem o devido tratamento poderão contaminar os solos e os veios freáticos. Este risco é chocante e exige fiscalização permanente e rigorosa!

O mais chocante não é países mandarem o lixo que não querem na sua terra e pagarem 9€ por tonelada quando noutros pagam 80€. Chocante é aceitarmos receber lixo que outros países produzem. Nós temos de tratar do nosso e esse já é um grande problema. E deve ser tratado e não enterrado sem fiscalização a comprovar o que está a ser depositado.

Chocante é existir um aterro que atualmente afeta a vida de uma população pelos cheiros nauseabundos que emite e que estarão a contaminar os solos e veios de água com consequências nefastas para as próximas gerações. Quem vai pagar essas consequências? A empresa não será certamente porque nessa altura ou não existe, ou terá outro nome.

Chocante será se, com tanto mediatismo, nada acontecer. Lembro como comecei este artigo. Foi preciso fazerem notícia lá fora para finalmente ser notícia cá dentro. E para um aterro numa vila do concelho de Valongo ser notícia num qualquer país do mundo, é porque algo de grave e mau ali se passa.

Estamos no século XXI, não somos terceiro mundo nem temos populações de terceira classe, por isso e para que tudo isto deixe de ser chocante, acabem com este aterro.

Não podemos continuar a alimentar conversas senão acabarão por cheirar tão mal quanto o aterro. São precisas medidas concretas com vista à resolução e eliminação deste cancro e cancros só se resolvem eliminando-os completamente.