Há um ano a Câmara Municipal de Lousada lançou o projecto Lixo Sustentável. A ideia era simples: dar descontos na factura do lixo a quem recicle. E o balanço é mais que positivo, garante o vereador do Ambiente. Já há 400 famílias que vão ao ecocentro entregar papel, vidro e plástico e mais de 100 toneladas de resíduos foram desviadas de aterro.

Quem se juntou ao projecto só vê vantagens. Além de ajudarem o ambiente conseguem poupar. E há mesmo quem já tenha deixado de pagar a factura em alguns meses e quem tenha pago apenas 0,05 cêntimos.

Por isso, adianta Manuel Nunes, o município vai manter o projecto e quer, nos próximos anos, bater estes números. Uma das metas passa por criar três mini ecocentros, que vão aumentar a rede de pontos de entrega no concelho.

“Já tive desconto em cinco facturas, no próximo mês não devo pagar e ainda vou ficar com crédito”

“Apologista da reciclagem”, Maria Irene Magalhães, de 66 anos, professora do primeiro ciclo reformada diz que não deita nada fora. “Já quando dava aulas ensinava os meninos a separar o lixo. Detesto ir a um balde e ver garrafas de vidro ou plástico no lixo”, explica a residente em Cristelos. Vive sozinha, mas as filhas frequentam regularmente a casa e também ajudam no processo de reciclagem e, na Universidade Sénior que frequenta, as colegas também juntam papel, vidro e cartão para ela entregar no ecocentro. “Eu junto e venho cá umas duas vezes por semana”, conta.

Em média, paga 15 euros por mês pela factura de água e resíduos, mas desde que aderiu ao projecto, em Agosto do ano passado, já teve vários descontos. “Já tive desconto em cinco facturas, no próximo mês não devo pagar e ainda vou ficar com crédito”, adianta.

Só Maria Irene Magalhães já entregou mais de 700 quilos de resíduos, sobretudo papel e cartão. O processo é sempre igual. Trazem plástico, vidro e papel separados ao ecocentro, em Boim, que são pesados, ficando registada a quantidade entregue. Depois é só colocar os resíduos nos respectivos contentores. “Não custa nada”, garante.

Está também, frequentemente, a incentivar os familiares a fazerem reciclagem e a aderirem a este projecto. “Eles também já reciclam mas vão aos ecopontos”, adianta. Já ela não tem dúvidas sobre manter-se inscrita no Lixo Sustentável. “Já me preocupava com o ambiente mas este desconto dá vantagens”, salienta.

“Ganhamos todos, sobretudo o ambiente”

Também a família Rodrigo Moreira, de 76 anos, e Eva Amélia, de 73 anos, que moram com um filho, a nora e dois netos, se juntou a este processo. É a filha Fátima Moreira, de 50 anos, que os ajuda. “Eu já tinha esse cuidado de reciclar e os meus pais iam fazendo alguma coisa, mas pouco. Este desconto foi um estímulo para começarem a fazê-lo de forma mais organizada”, reconhece.

Vivem em Silvares, mesmo no centro da vila, e uma vez por semana vão ao ecocentro. “Eu ajudo a ir pôr o lixo nos sacos quando é para entregar”, explica Rodrigo Moreira. E têm feito mais. Vão passando a palavra e incentivado outros a reciclar. “Há outro irmão que também já recicla. Ganhamos todos, sobretudo o ambiente”, assume Fátima Moreira.

Costumavam pagar entre 20 a 30 euros mensais pela factura. Uma das últimas rondou os 7,75 euros, mas houve mais baixas. “Quando o desconto era feito de três em três meses chegamos a pagar uma factura de 0,05 cêntimos e outra de 0,34 cêntimos”, conta Fátima Moreira.

“Não dá trabalho nenhum, é uma questão de querer. Quando olhamos para o monte é que percebemos a quantidade de lixo que produzimos”, sustenta. Os dados do município mostram que desde o início do projecto a família já encaminhou para reciclagem cerca de 1.100 quilos de resíduos e ganhou mais de 100 euros de desconto.

“Antes deste processo, o funcionário do ecocentro tinha três a quatro pessoas a virem cá por semana agora tem dezenas de pessoas e às vezes fazem fila. Se mais não for, pelo exemplo e acção positiva que isso deixa, já valeu a pena”

Vamos a números. Neste primeiro ano do projecto aderiram 400 famílias lousadenses, num total de cerca de 1.700 pessoas. As entregas realizadas permitiram desviar de aterro 101,8 toneladas de vidro, papel e plástico. No total, foram entregues, em média, cerca de 7,8 toneladas de resíduos por mês no Ecocentro de Boim. Ao todo estamos a falar de 3.337 entregas.

Este ecocentro, até agora desconhecido da maioria da população e pouco frequentado, é hoje um local movimentado, reconhece Manuel Nunes. “Temos 47 mil habitantes e 90% nunca terá vindo ao ecocentro. Antes deste processo, o funcionário do ecocentro tinha três a quatro pessoas a virem cá por semana agora tem dezenas de pessoas e às vezes fazem fila. Se mais não for, pelo exemplo e acção positiva que isso deixa, já valeu a pena. Mas também temos o ganho ambiental, que nos interessa potenciar”, sustenta o vereador do Ambiente.

O projecto Lixo Sustentável foi lançado oficialmente a 5 de Junho de 2017, no âmbito do Ano Municipal do Ambiente e Biodiversidade, mas a ideia germinou muito antes. Este executivo, lembra o autarca, fez uma análise do concelho e criou uma estratégia que visava mobilizar a sociedade civil para a sustentabilidade do território, criando acções, programas educativos, programas de desenvolvimento social, programas infra-estruturais, para desenvolver uma consciência colectiva em torno de uma preocupação comum que é o ambiente. “O ambiente não é uma moda, é uma preocupação transversal, um imperativo social, económico e de civilização”, defende Manuel Nunes.

Havia muito a fazer e os resíduos foram apenas uma das preocupações a resolver. “Por cada tonelada que é colocada em aterro há uma TGR (taxa de gestão de resíduos) que é cobrada pelo Estado e que temos que repercutir nos munícipes. Mas mais que isso, grande parte dos resíduos em aterro não deviam ir lá parar porque são valorizáveis ou orgânicos”, refere o vereador.

“Para os próximos meses o objectivo é passar as 10 toneladas mês e, para o próximo ano, conseguir ultrapassar as 120 toneladas totais”

O projecto Lixo Sustentável nasceu para mitigar essa situação. A par disso foram colocados mais ecopontos no concelho e realizadas outras acções de sensibilização. O efeito foi mais que positivo. “A pegada ecológica ao nível dos resíduos é bastante mais reduzida do que antes de iniciarmos este processo”, garante o autarca de Lousada. “Estes são resíduos que não vão andar espalhados nem vão parar a aterro e que vão reduzir a taxa de TGR que vai ser cobrada às pessoas. Há um ganho que é colectivo”, acrescenta.

O desafio agora é aumentar esse ganho. Por isso, este é um projecto que o município quer manter e alargar ao resto do território de forma mais consistente.

“Se pensarmos que há um atrás não havia ninguém a fazê-lo, ter 400 famílias no projecto é um ganho considerável. Claro que o propósito passa por replicar isto, para que, tenhamos ecocentros em todo o concelho para que as pessoas possam fazer as suas entregas. Dessa forma, quem vive no Torno, em Vilar ou em Cernadelo não vai ter que fazer 15 quilómetros para depositar o seu lixo aqui”, avança Manuel Nunes.

Isso passará por ter mais três mini ecocentros em Lousada. “Em dois anos queremos ter esses espaços concretizados para termos o território coberto e para que qualquer cidadão não tenha que fazer mais do que dois a três quilómetros para depositar resíduos”, diz.

Outro objectivo é tornar a separação num hábito, “independentemente de haver ou não a compensação”, passando a ser um gesto quotidiano. “Para os próximos meses o objectivo é passar as 10 toneladas mês e, para o próximo ano, conseguir ultrapassar as 120 toneladas totais. Quando esses mini ecocentros estiverem em pleno funcionamento queremos ter não 400 famílias mas o quádruplo”, sustenta o autarca.

Com o estímulo dado, um consumidor doméstico ou não doméstico, como associações e entidades sem fins lucrativos, no limite, podem ficar isentos da taxa de resíduos no final do ano. Para cada família o valor do desconto é significativo. “Nem que seja a remoção completa da taxa de resíduos na factura já compensa, são cerca de 72 euros por ano”, diz o vereador. E ainda podem ficar com crédito.

Para o município, o investimento “foi nulo face ao retorno”. “O investimento passa pelo funcionário que já existia, uma balança e o valor das compartições, que face ao ganho que estamos a ter é pouco expressivo. E temos o ganho social, ambiental e de envolvimento colectivo”, argumenta.

1 Comentário

  1. Excelente artigo, bem escrito e melhor explicado.
    Vindo de um perito na matéria, não tenho a menor dúvida que é verdade tudo quanto é aqui tão bem explicado.
    Por outro lado e para confirmar tão douta opinião, basta reparar nas terriolas que aderiram rapidamente à alteração do sistema de iluminação…
    Onde está o céu estrelado?…
    Eu passo férias em dois locais lindíssimos de Portugal (praia e montanha).
    Tanto no localidade junto mar, bucólica e maravilhosa, a iluminação é toda feita com candeeiros/lâmpadas de luz amarela. Que beleza!
    Na montanha (Parque Natural), bem como nas Aldeias transmontanas ou geresianas que visito com frequência (e algumas são das mais belas do mundo, como Sistelo ou Rio de Onor), também a iluminação pública é feita com luz amarela!!!
    Por que será?…

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