A Câmara Municipal de Paredes pagou obras que não existem nos centros escolares construídos no concelho. A lista de desconformidades com os cadernos de encargos das obras é longa e foi, hoje, divulgada, em conferência de imprensa, pelo presidente da autarquia, que promete mandar a questão para o Ministério Público.

Em causa, disse Alexandre Almeida, estão, por exemplo, materiais e equipamentos, caves, relvados, estores, painéis solares, previstos, mas não colocados, e que foram pagos pelo município. Prática comum foi também a substituição de materiais por outros de qualidade inferior, tendo sido pagos os mais caros.

No total, a autarquia estima um prejuízo de cerca de três milhões de euros. “É um duplo prejuízo para a câmara. Pagou por coisas que não foram colocadas e, como não cumpriu os cadernos de encargos, terá que devolver fundos comunitários”, referiu o autarca.

Cadernos de encargos não foram cumpridos

Um ano depois das eleições que lhe deram a presidência da Câmara de Paredes, Alexandre Almeida veio, novamente, apontar críticas ao passado. “Não podíamos ficar cúmplices desta situação”, sustenta.

Depois de um trabalho de vistoria aos centros escolares do concelho, que custaram milhões mas aos quais já têm sido apontados inúmeros problemas infra-estruturais que o autarca promete corrigir aos poucos, Alexandre Almeida veio a público denunciar uma série de desconformidades que existem entre o que estava previsto nos cadernos de encargos e o que foi efectivamente feito, com prejuízo para o município.

“O que encontramos no terreno é muito grave”, garante o edil. Em muitas escolas, havia obras previstas no caderno de encargos que não foram realizadas mas foram pagas e é recorrente a substituição de materiais por outros de qualidade mais baixa. Por exemplo, em Cete, o centro escolar devia ter cobertura de zincotitânio, só que a colocada é de painel sanduiche, e a câmara terá pago a mais 66 mil euros e no Centro Escolar de Duas Igrejas foram pagos 129 mil euros por estores exteriores que não existem. Já o Centro Escolar de Paredes é um dos que tem mais irregularidades. A cobertura não é a prevista e foram pagos 145 mil euros a mais por um material de menor qualidade, uma zona relvada de 44 mil euros não está lá e o parque infantil foi facturado ao dobro do que realmente vale, diz o autarca.

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Apesar de todas estas desconformidades, não houve garantias accionadas junto dos empreiteiros, critica Alexandre Almeida, dizendo que tem estado a notificá-los nos casos que ainda estão dentro do prazo. “Caso não resolvam as desconformidades vamos accionar a garantia”, promete.

Só nos casos dos centros escolares de Recarei, Duas Igrejas e Baltar, em que as candidaturas já foram fechadas, terão que ser devolvidos 700 mil euros em fundos comunitários, dá como exemplo.

“Entre aquilo que a câmara pagou a mais e não foi colocado, mais o prejuízo que vai ter por não ter respeitado os cadernos de encargos estamos a falar de três milhões de euros”, salienta Alexandre Almeida. Os dados recolhidos seguem, esta semana para o Ministério Público, garante.

“Esta foi uma oportunidade perdida. Podíamos ter centros escolares de grande qualidade em Paredes, mas temos centro escolares com gravíssimos problemas”, lamenta.

Culpa será avaliada pela justiça

De quem é a culpa, diz Alexandre Almeida, caberá ao Ministério Público avaliar. Mas em causa estarão sempre as empresas de fiscalização, os empreiteiros e o anterior executivo, sustenta. “Quem fez a fiscalização foram empresas externas. É óbvio que deviam ter sido acompanhadas por técnicos da câmara. O que vemos é que o executivo anterior não acompanhou essas obras e não cumpriu o que estava previsto nos cadernos de encargos”, argumenta o presidente da Câmara. “Se a gerência não acautela os interesses da câmara municipal a culpa não é só dos empreiteiros, é de quem não acompanhou e fiscalizou estas obras”, reitera.

O autarca diz já ter questionado os técnicos municipais sobre estas situações sem obter grandes respostas. “Perguntei como justificavam estas divergências e eles não souberam explicar”, refere. “Os técnicos deviam ter acompanhado de forma diferente estas obras e, se calhar, não acreditarem tanto na fiscalização dessas empresas externas”, critica.

Recorde-se que a Câmara Municipal de Paredes tem que devolver outros seis milhões de euros no âmbito de um processo do Organismo Europeu de Luta Anti-fraude (OLAF) que detectou indícios fraude, corrupção, falsificação de documentos e viciação de empreiteiros e das empresas que fizeram fiscalização nas obras dos centros escolares nas mesmas escolas.

Alexandre Almeida diz que a questão está em segredo de justiça, mas que vão constituir-se como assistentes nesse processo.

Exemplos de desconformidades em cada centro escolar

Baltar – valor do prejuízo 84.846 euros

Nesta escola estava prevista a colocação de lajetas pré-fabricadas no valor de 56 mil euros e a construção de uma cave orçada em 15.877 euros. Foram pagas mas não existem.

Cete – valor do prejuízo 75.675 euros

A Câmara teve um prejuízo de 66 mil euros (mais IVA) porque estava prevista uma cobertura de zincotitânio e foi colocada uma de painel sanduiche, material mais barato. E deviam existir 10 painéis solares, mas só lá estão quatro.

Duas Igrejas – valor do prejuízo 297.623 euros

Estava prevista a colocação de estores exteriores que foram pagos mas não foram colocados. Só aí estão 129 mil euros. Também não existe o sistema de aproveitamento da energia solar termodinâmico para aquecimento de 66 mil euros, ou o piso radiante do ginásio orçado em mais de 14 mil euros.

Gandra – valor do prejuízo 3.183 euros

Deviam existir neste centro escolar 14 painéis solares mas apenas foram instalados 10.

Lordelo 1 – valor do prejuízo 69.541 euros

Esta escola também tem menos painéis solares que o previsto, mas a diferença maior em termos monetários está no pagamento de mais de 43 mil euros por duas bombas de calor que não foram colocadas.

Lordelo 2 – valor do prejuízo 13.527 euros

As caleiras deviam ser em aço inox mas não são. A diferença de preço para o material colocado dá um prejuízo de 10.904 euros.

Mouriz – valor do prejuízo 103.409 euros

Mais uma vez o material usado na cobertura não foi o previsto. O mesmo aconteceu com o piso que devia ser em taco ao cutelo, segundo o caderno de encargos, mas foi vinílico, uma diferença de 27.880 euros. Também deviam ter sido colocadas unidades interiores de distribuição de calor do tipo cassete, de 26 mil euros, que foram pagas mas não existem.

Paredes – valor do prejuízo 362.165 euros

É o centro escolar com mais irregularidades detectadas. A cobertura colocada não foi a prevista e a diferença de valor é de 145 mil euros, devia existir uma zona relvada de quase 44 mil euros que foi paga mas não está lá e um parque infantil foi pago pelo dobro do que vale. Já os equipamentos AVAC custaram 123 mil euros, estão lá mas nunca foram postos em funcionamento.

Rebordosa – valor do prejuízo 126.741 euros

Aqui houve ventiloconvectores para a distribuição de aquecimento que foram pagos pela Câmara mas não existem, além de coberturas e revestimentos que não cumprem o caderno de encargos, sendo os materiais de qualidade inferior mas tendo sido pagos os valores dos originalmente previstos.

Recarei – valor do prejuízo 153.333 euros

Foram pagos 65 mil euros por painéis MDF e madeira de Mogno que não estão na escola. As paredes e coberturas deviam ter sido impermeabilizadas e não foram e os revestimentos também não batem certo.

Sobreira – valor do prejuízo 109.016 euros

Mais uma vez a cobertura de zincotitânio passou a painel sanduíche, uma diferença de 66 mil euros. Os painéis solares são menos que os previstos e foram pagos 10 quando só há quatro e o pavimento é em vinílico ao invés de madeira.

Sobrosa – valor do prejuízo 26.250 euros

Houve equipamentos para a distribuição de aquecimento que foram pagos mas não instalados. Isso implicou um custo indevido para o município de 24 mil euros.

Vilela – valor do prejuízo 55.704 euros

A Câmara pagou uma cobertura de zinco, mas a colocada é de chapa ondulada. Perdeu aí quase 19 mil euros. Outros quase 30 mil foram para equipamentos de dispersão de aquecimento que não foram colocados mas foram pagos.

* a todos os valores mencionados acresceria IVA

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