O distante ensino presencial

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O confinamento a que fomos obrigados na Primavera representou um hiato que, mais do que a perda de novas competências ou conhecimentos, fez emergir a ausência das coisas naturais e comuns que caracterizam o desenvolvimento humano.

Não foi a tabuada dos nove que ficou por aprender. Foi a ausência dos amigos da classe que  fez falta às crianças. Esse período de tempo já aconteceu e está difícil voltar à irrequietude

Não foi o desconhecimento do processo de hominização que sempre poderá ser aprendido e apreendido que causou tristeza aos adolescentes. Faltaram as correrias estouvadas do esconde-esconde, na escola, que se perderam e não puderam voltar a repetir-se. Porventura, quando voltar a normalidade, as brincadeiras preferidas já serão outras.

Não foi a curiosidade sobre a aprendizagem do sistema reprodutor que lhes diminuiu a capacidade de perceber que há diferenças entre o sexo e o amor. Foram as entradas desorganizadas, transpirados, dos curtos, mas intensos jogos à bola durante os intervalos entre aulas que não voltaram e, provavelmente, não voltarão a repetir-se tão cedo.

Não foi o desconhecimento da Hermenêutica ou os fenomenais movimentos artísticos do séc. XX que tornaram mais infelizes os jovens. A escola se encarregará de lhes pagar essa dívida. Terá sido, antes, a curiosidade normal pelo conhecimento do outro, o flirt inocente e característico da juventude a despertar.

Como se não bastassem as mazelas provocadas pelo castrador pandémico, ei-los de volta à escola. Mais tristes, talvez, mas com mais esperanças, provavelmente. Mais curiosos, no mínimo.

E o que encontraram? Ao contrário do que ouviam dizer, afinal, a escola está ainda longe de ser o que era. Afinal, nem tudo está bem. Afinal, nem tudo ficou igual.

Que estamos a aprender muito com a pandemia que nos consome, disso ninguém tem dúvidas, mas temos também a certeza de que, com ela, perdemos outro tanto das nossas vidas.

A escola é hoje, de certeza, um dos locais mais seguros, para os nossos filhos estarem. E é-o mais para aqueles que, infelizmente, fora do contexto escolar não encontram modelos responsáveis para viver estes tempos.

As restrições necessárias determinadas pelas condicionantes dos dias que se vivem estão a colocar em causa a aquisição das competências sociais de que carecemos todos cada vez mais.

É certo que as ambulâncias têm hoje menos trabalho com as escolas. É também adquirido que os problemas disciplinares diminuíram, mas a escola enquanto local de desenvolvimento e construção do indivíduo integral deu um passo atrás.

Este mundo que junta os afetos ao conhecimento, o sítio que mais recordações nos trará para a vida inteira, o espaço que teima em não deixar ninguém para trás, o universo que nos aproxima mais da utopia da igualdade está agora mais distante. A escola está doente, como o mundo.

Só as dúvidas sobre o futuro nos conseguem preocupar mais.