Foto: Fernanda Pinto/Verdadeiro Olhar - Neto de Pereira Inácio recebeu lembrança das crianças do Centro Social e Paroquial de Baltar

Industrial, filantropo e benemérito do concelho de Paredes e, sobretudo, de Baltar, terra onde nasceu, o comendador António Pereira Inácio foi homenageado, esta sexta-feira, a título póstumo, com a Medalha de Ouro do Município de Paredes.

Netos e bisnetos de Pereira Inácio vieram propositadamente do Brasil para participar nas cerimónias de inauguração das novas instalações do jardim-de-infância do Centro Social e Paroquial da Vila de Baltar. Trouxeram ainda como prenda um donativo de cerca de 200 mil euros para a requalificação do edifício da Casa António Pereira Inácio, que vai acolher o ATL, centro de estudos e gabinete do RSI da instituição.

Todos os presentes teceram elogios à acção solidária da família Moraes que nunca esqueceu as suas raízes.

Família é “brasileira de nacionalidade mas baltarense de coração”, considerou o padre Mário João

O Centro Social e Paroquial de Baltar serve 286 utentes distribuídos por várias valências de apoio aos seniores e às crianças. Só o renovado jardim-de-infância, cuja obra custou cerca de 800 mil euros, tem capacidade para 120 crianças.

A obra foi hoje inaugurada com a presença da família do grande benemérito da instituição, António Pereira Inácio, que fez fortuna no Brasil mas que nunca esqueceu a terra onde nasceu.

Durante a cerimónia realizada, o padre Mário João Soares, que preside à direcção da Instituição Particular de Solidariedade Social (IPSS) realçou que se concretizou mais um sonho e agradeceu a presença da família Moraes que considerou “brasileira de nacionalidade mas baltarense de coração”.

“O comendador Pereira Inácio partiu para o Brasil aos 10 anos em busca de uma vida melhor. Estudou, lutou e a vida sorriu-lhe. Tornou-se num empresário de sucesso e sempre valorizou a educação e a solidariedade sem nunca esquecer a sua terra”, disse o dirigente. “Baltar deve muito a Pereira Inácio, que soube passar os valores de solidariedade à família” que doou todos os terrenos em Baltar à instituição nos anos 60 do século passado, recordou o pároco.

Terminada a obra do jardim-de-infância, a direcção do Centro Social e Paroquial de Baltar lançou-se no desígnio de recuperar a Casa Pereira Inácio. Sabendo do objectivo mais uma vez a família do comendador quis ajudar e “como prenda de Natal” dispôs-se a doar 150 mil euros e a vir a Baltar. Um valor que, entretanto, aumentaram para os 200 mil euros. “Sabemos que não falta onde ajudar. E isto para nós é uma ajuda preciosa. Obrigado por nos permitirem continuar a sonhar e a apoiar a educação. Aqui também é a vossa casa e convido-vos a estar na inauguração da casa do vosso avô e bisavô”, concluiu Mário João Soares.

Foto: Fernanda Pinto/Verdadeiro Olhar

Presente na sessão, o presidente da Câmara Municipal de Paredes considerou a atribuição da Medalha de Ouro do Município a este industrial, filantropo e benemérito como uma “justa homenagem” a um baltarense muito estimado pela população. “O Grupo Votorantim escolheu a educação como mote das comemorações do centésimo aniversário e também o nosso executivo elege a educação como prioridade”, destacou Alexandre Almeida. “O comendador Pereira Inácio é, para nós, um exemplo a seguir”, acrescentou, entregando aos netos Ermírio Moraes e Maria Helena Scripilliti a Medalha de Ouro do concelho.

Em representação da família, Fábio Moraes, bisneto do comendador, lembrou que vieram do Brasil para prestar homenagem ao avô e bisavô num ano com significado especial. “O Grupo Votorantim faz 100 anos. Emprega mais de 40 mil funcionários em vários sectores. Mas nunca esquecemos as nossas origens, a nossa ligação a Portugal e a Baltar”, assumiu, frisando que também investiram no país através de uma participação na Cimpor.

“Assumimos hoje mais um compromisso com a comunidade de Baltar. A doação dos fundos para obras sociais tem relevância mas mais importante é o trabalho dos voluntários que dedicam tempo a quem precisa”, afirmou Fábio Moraes, agradecendo a todos os que contribuem para as causas do Centro Social e Paroquial de Baltar.

O valor da recuperação da Casa Pereira Inácio ainda não está apurado mas será superior a 300 mil euros, adiantou o presidente da direcção da instituição. O ATL terá capacidade para 75 crianças e o gabinete de apoio aos beneficiários do Rendimento Social de Inserção é utilizado por cerca de 580 pessoas.

Quem foi António Pereira Inácio

António Pereira Inácio nasceu em Baltar, em 1874, e faleceu no Brasil, em 1951. Foi lá que fez fortuna e que ficou conhecido como o “rei do Algodão e do Cimento”.

Ainda criança partiu para o Brasil com o pai e instalou-se em São Paulo, na cidade de Sorocaba. Trabalhou como sapateiro e fez escola à noite até começar a trabalhar na área do comércio em 1888.

Aos 18 anos criou o seu próprio armazém com a ajuda do pai. Casou-se em 1899 e foi pai de três filhos: João, Paulo e Helena.

“A sua actividade de empreendedor destaca-se, desde 1899 até final do 1.º terço do século XX, pelo desenvolvimento da indústria relacionada com o algodão (fundou a fábrica Santa Helena), com o objectivo de aproveitar as suas sementes e produzir óleo vegetal, adquiriu também uma fábrica de cimentos, e adquiriu a Lusitânia, empresa dedicada à preparação, fiação, tecelagem e estamparia do algodão”, lê-se na resenha da proposta aprovada pelo município.

Entre 1915 e 1918 adquiriu fábricas de tecidos e um banco e formou a Sociedade Anónima Fábrica Votorantim, que presidiu até à sua morte.

Já depois de ser empresário foi também operário, durante um ano, numa fábrica nos Estados Unidos da América, para entender o funcionamento das máquinas. Acabou por tornar-se no 1.º presidente do Centro das Indústrias de Fiação e Tecelagem, nos Estados Unidos.

Em 1923, recebeu a Comenda da Ordem de Cristo de Instrução e da Benemerência e a de Mérito Industrial, e, no Brasil, recebeu, em 1936, a Comenda da Ordem do Cruzeiro do Sul, atribuída pelo presidente Getúlio Vargas.

Nessa altura, “empregava mais de 10 mil operários e empregados, que viviam junto das fábricas em habitações confortáveis e dispunham de creche, escola maternal, escola primária, campo de jogos, teatro, igreja, farmácia, consultório médico, biblioteca, numa área superior a 24 mil hectares, servida por quatro estações de caminho-de-ferro, sendo que uma das estações se chamava Nova Baltar”. Todos os seus empregados aprendiam a ler e escrever.

Reconhecido como o “Rei do algodão e do cimento” do Brasil, dedicava-se também à produção de laranja, que exportava para Inglaterra.

António Pereira Inácio nunca deixou de ajudar a sua terra natal. Apoiou a “criação e organização da Corporação dos Bombeiros Voluntários de Baltar e ofereceu à Misericórdia de Paredes, em 1931, de ‘5 contos’ para a construção do Hospital, fazendo nova doação em 1933”. Foi ainda responsável por propor a criação da Sociedade Humanitária de Salvação Nacional, “com o objectivo de ajudar os mais pobres da freguesia de Baltar, tendo para o efeito angariado fundos ou custeado na íntegra a construção ou organização de escolas e de casas para os mais pobres, de uma cantina permanente, de cursos escolares de alfabetização gratuitos e o fornecimento de agasalhos aos necessitados, a instalação eléctrica e a maternidade, a creche, onde era distribuída uma refeição ao meio-dia, quer às crianças que a frequentavam, quer às que não iam à escola, num custo total que ultrapassava anualmente os 100 contos”.

A creche D. Lucinda Pereira Inácio, em Baltar, foi inaugurada em 1935 e destinava-se às crianças mais pobres.