“Todos sabem o que é o daltonismo?”, pergunta Bárbara Santos, da ColorADD Social. “Sim”, respondem em coro os alunos do Centro Escolar de Paredes. Mas entre o saber e o sentir na pele como seria viver com esta limitação vai uma grande diferença. Por isso, 850 crianças do 4.º ano das escolas de Paredes foram desafiadas a experimentar, esta semana, no âmbito de uma sessão de sensibilização e de um rastreio, como é ser daltónico.

Depois de aprenderem o “alfabeto das cores”, os símbolos que permitem a quem sofre de daltonismo saber qual a cor que está a escolher, os alunos tentaram colorir um desenho, usando uns óculos especiais que lhes mostram como é que um daltónico vê o mundo. Assumiram que é difícil.

Foto: Fernanda Pinto/Verdadeiro Olhar

É difícil, reconheceram alunos

Primeiro vieram as explicações. “Os daltónicos não trocam as cores, confundem-nas. Daqui a pouco já vão ver como é”, prometia Bárbara Santos, explicando aos meninos e meninas a simbologia do ColorADD. Entretanto, puderam também fazer um rastreio para detectar precocemente qualquer problema existente na distinção das cores.

No mundo há 350 milhões de daltónicos, sendo que um em cada 10 homens e uma em cada 200 mulheres têm este problema, refere a responsável da ColorADD Social.

Seguiu-se a parte prática, com as crianças a terem de pintar seguindo apenas a simbologia das cores presente nos lápis. Foi aí que começou o burburinho. “Isto é amarelo”, “não sei que cor é esta”, “isto parece verde, mas não é”, “onde é que está o vermelho?”, ouvia-se um pouco por toda a biblioteca da escola.

Com estes óculos que ajudam a sentir como é a vida de um daltónico houve quem pintasse laranjas de castanho e bandeiras nacionais todas vermelhas ou verdes e azuis. Só depois que os tiram vêem o resultado. “Foi difícil?”, questiona Bárbara Santos. “Foi”, confessam.

“O mais difícil foi pintar. Era muito difícil encontrar as cores, ficam iguais”, confessou Beatriz Menino, de 10 anos. “Eu tinha visto estes símbolos na praia. Tinha sido o meu pai que me tinha dito o que eram, porque eu não sabia”, conta a aluna de Paredes. “Estive a aprender como é que os meninos que têm daltonismo vêem as coisas e como é que eles fazem para distinguir as cores. Um daltónico vê tudo igual e muitas coisas não têm ainda este código. Ter os símbolos nos lápis de cor ajudou muito. Vou explicar o que aprendi aos meus pais e irmãos”, prometeu.

Também Daniel Pereira, da mesma idade, assumiu que “para os daltónicos é muito difícil distinguir as cores”. “Eu não me enganei, mas não pintei tudo. Estes símbolos são importantes. Eu não os conhecia. Vou estar mais atento”, disse. “Quando chegar a casa vou dizer aos meus pais dizer que o vermelho é um V e o azul é um A. Se conhecesse um daltónico ia ajudá-lo a comprar roupa”, garante.

Problema sem cura e que traz limitações

Foto: Fernanda Pinto/Verdadeiro Olhar

Durante esta semana, o “Programa ColorADD nas Escolas”, desenvolvido pela ColorADD Social, em parceria com a Câmara de Paredes, esteve nas escolas do concelho para sensibilizar os mais de 850 alunos do 4.º ano do ensino básico para este problema “sem cura” e com implicações na vida diária.

“Este projecto é uma sensibilização para a questão do daltonismo que é uma limitação que não é visível e, muitas vezes, passa despercebida”, refere Bárbara Santos.

São realizadas actividades direccionadas a professores e crianças “para eles poderem experienciar o que é ter esta limitação que vai criar muito constrangimento na aprendizagem e mesmo nas questões do dia-a-dia, seja a jogar futebol, a escolher a roupa, ou um lápis para colorir”. A par disso é feito um rastreio de daltonismo. “Procura perceber-se qual a média de crianças daltónicas. Fazemos quase um censo, porque não existem registos nenhuns, para que as crianças que têm essa limitação possam ser devidamente acompanhadas ao longo do seu percurso escolar. Não rotulamos, não divulgamos às crianças”, clarifica a responsável do ColorADD Social.

Foto: Fernanda Pinto/Verdadeiro Olhar

Além de ensinarem “o alfabeto das cores” deixam ferramentas à escola para que possa continuar o trabalho, dentro da sala de aula ou na biblioteca.

A ColorADD Social leva este projecto ao país inteiro e já chegou a 33 mil crianças desde 2014. “Este é um rastreio preliminar que terá de ser confirmado em consulta de especialidade”, esclarece.

Nascer daltónico vai mudar a forma como se vive. “Desde saber de que cor nos vamos vestir à maquilhagem, a cor do semáforo ou da caneta com que vamos escrever. Uma senhora brasileira uma vez contou que sentia o emprego em risco todos os dias. Recebia actas com texto a dizer ‘o que está a verde é para colocar e o que está a vermelho é para retirar’. E ela não distinguia as cores”, dá como exemplo.

Prevenir o bullying e o insucesso

Outros viveu-os ela própria. “No ano passado numa escola onde estivemos entrei numa sala de aulas para fazer uma actividade e tinha um quadro de giz e o único giz que tinha era cor de laranja. Eu escrevi ColorADD no quadro e estávamos a fazer a acção com as crianças e um menino diz-me ‘como se chama este código?’. Eu respondi ‘está escrito no quadro’. E ele disse ‘não está nada ali escrito, não vejo lá nada’. Não via. Ele era daltónico e um quadro verde escuro com um giz cor de laranja para ele era como não ter nada. A professora percebeu depois que ele não copiava coisas do quadro e dava imensos erros apenas porque para ele não estava lá nada”, resumiu Bárbara Santos.

Foto: Fernanda Pinto/Verdadeiro Olhar

Ser daltónico pode levar a enfrentar alguns problemas. Por isso, estas acções pretendem ainda, ao detectar precocemente o problema, prevenir o insucesso e abandono escolar precoce, baixas auto-estima e auto-confiança e situações de bullying, que pode vir tanto dos outros alunos como mesmo dos professores, sobretudo por desconhecimento. “Já tivemos um caso de um menino que a própria professora dizia que era burro porque não conseguia entender um mapa. E ele não conseguia descortinar as cores para fazer a análise. Mesmo não intencional, existe bullying não só por parte dos colegas, mas também por parte dos próprios professores”, admite Bárbara Santos.