Às vezes, somos tentados a fazer comparações de estilo entre o actual Presidente da República e o anterior. Tratando-se de um cargo pessoal, influenciado pelas características pessoais de quem o exerce, traçar comparações pode ser um exercício falhado.

Assim, sendo Aníbal Cavaco Silva homem muito diferente de Marcelo Rebelo de Sousa, é natural que os dois desempenhem as funções de Presidente da República de modo bem diverso. Aníbal Cavaco Silva nasceu em Boliqueime, longe de Lisboa, numa família de origens modestas. Já Marcelo Rebelo de Sousa nasceu em Lisboa, filho de um médico que foi governador-geral de Moçambique e ministro de Marcelo Caetano, e de uma assistente social, estudou no Liceu Pedro Nunes, por onde passava a elite lisboeta. O primeiro estudou números, o segundo estudou leis. Por isso, fazer comparações entre duas pessoas com origens, formação e percursos de vida distintos pode ser uma falácia.

Cavaco Silva é um homem de aparência austera, de poucos sorrisos e muito formal. Estas características, associadas a um tempo de crise e intervenção internacional, fizeram dele, principalmente na parte final do seu mandato, uma figura impopular para muitos portugueses. Marcelo Rebelo de Sousa chega à Presidência da República como uma espécie de anti-Cavaco. Homem de sorriso fácil, afectuoso e muito popular. É esta popularidade que parece estar a transformar-se em populismo.

Em Portugal, parece não haver quem não tenha uma selfie com o Presidente da República. Além disso, o Presidente fala de tudo e está em tudo, comentando tanto a morte de um actor como um golo falhado no Mundial de Futebol. Este fim-de-semana subiu ao palco do Rock-in-Rio para cantar com os Xutos e Pontapés. Só que este populismo, aos poucos, condicionará a acção de um Presidente habituado a receber palmas e que, por isso, poderá vir a não se arriscar a fazer nada que faça quebrar esse populismo.

Esta semana, Helena Matos escrevia que “os outrora tão criticados espectáculos da política e a política-espectáculo deram lugar a algo completamente diferente e muito mais perigoso: o espectáculo enquanto forma de preencher o vazio da política”. Cavaco Silva era um chato, que teimava em falar ao país (como falava pouco, nós ouvíamos o que ele nos dizia) para nos explicar que o país caminhava para uma falência. Por exemplo, ontem, foram divulgados dados económicos que indicam que a dívida pública atingiu o seu máximo histórico, elevando Portugal para o quarto lugar dos países mais endividados do mundo. Certamente que se o Presidente fosse o chato e sisudo do Cavaco Silva, teria dito alguma coisa sobre isto ou pedido explicações a quem nos governa.

Já nas relações do Presidente da República com outros chefes de Estado, este populismo tem tornado certas situações um pouco ridículas. Exemplo disso foram os encontros com os Presidentes da Rússia e dos Estados Unidos da América. No Kremlim, Putin recebeu Marcelo Rebelo de Sousa com uma comitiva de luxo: o Ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia e o homem forte do petróleo russo, Sechin. Perante este elenco, Marcelo falou de… futebol. Constrangidos, os políticos russos limitaram-se a sorrir. Na Casa Branca, Marcelo Rebelo de Sousa teve posições que saíram do protocolo, tentou dar uma lição de história a Trump, sentado na cadeira, de perna cruzada, num estilo “à vontadinha”, enquanto tentava umas tiradas cómicas.

Depois do poder de dissolver a Assembleia da República, o maior poder do Presidente é a magistratura de influência. Mas, para ser exercida, é preciso que, quando o Presidente falar, as pessoas e as instituições o ouçam e o levem a sério.