Carrinhos afastam medos e trazem sorrisos a crianças e pais antes das cirurgias

No Hospital Padre Américo o percurso dos mais pequenos até ao bloco operatório é feito em mini BMW’s. No Dia Mundial da Criança fomos conhecer três que tiveram um dia diferente

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Antes havia medos, ansiedade e, muitas vezes “berreiro”, no percurso até ao bloco operatório, sendo as enfermeiras quase “obrigadas” a arrancar as crianças do colo dos pais. Agora, desde a semana passada, os mais novos esquecem as preocupações e sorriem, tal é a alegria de poderem fazer o trajecto pelo corredor até à sala de cirurgia do Hospital de Penafiel a bordo de carrinhos eléctricos.

As mais-valias são para todos, garante Paula Guimarães, enfermeira gestora do Bloco Operatório e presidente da Comissão de Humanização do Centro Hospitalar do Tâmega e Sousa (CHTS). Há menos ansiedade nas mães e crianças e também nos profissionais de saúde.

No Dia Mundial da Criança, estes meninos e meninas que necessitaram de cirurgia tiveram um dia diferente, mas ainda assim com momentos alegres.

“Se não tivesse o carrinho ia agarrar-se mais a mim”

Renata Sofia, de sete anos, que foi perada hoje às adenoides, só fez uma exigência. Queria o mini BMW i8 Coupé em branco, um dos dois carros oferecidos pela Coração JAP – Associação de Solidariedade ao centro hospitalar.

Saiu da maca com alegria, pôs o cinto, experimentou a buzina e o rádio e pôs-se a caminho. Acelerou, travou, fez marcha atrás. “Diz adeus à mãe”, apela uma das enfermeiras. E Sofia acena e diz adeus, de sorriso no rosto, enquanto a mãe a fotografa embevecida. Ainda lhe conseguiu dar um beijo para, logo a seguir, a pequena se pôr a caminho do bloco operatório pela pista em que se transforma o corredor do hospital. “Gosto muito. É fácil de conduzir”, garante a menina, que ainda deu meia volta para uma última espreitadela à progenitora.

A mãe fica para trás, mas fica bem. “É bom vê-los a sorrir quando entram para o bloco ao invés de tristes”, afirma Rosa Matos, do Marco de Canaveses, sem esconder que, mesmo assim, ficou de “coração apertado”, como qualquer mãe.

“A Sofia gosta deste ambiente hospitalar. Diz que quando for grande quer ser doutora. Mas estava apreensiva porque era Dia da Criança e ia perder a festinha na escola. O carrinho compensou isso. Ficou contente”, assegura a mãe da menina.

“Achava que ia ser mais stressante. Ela é muito corajosa e reagiu bem a tudo. Mas se não tivesse o carrinho ia agarrar-se mais a mim. Ainda bem que foi assim, o clima não ficou tão pesado”, salienta.

“Eu buzinei! Fiquei contente. Depois o doutor deu-me uma pica e não vi mais nada”

Pelo mesmo passaram a pequena Beatriz, de três anos, e o Gonçalo, de seis anos, que hoje recuperavam das cirurgias e aguardavam alta.

Beatriz, de três anos, com a mãe

“Estive a escorregar no escorrega grande e foi bom. Fui de carrinho que dava música e dava para buzinar. Eu buzinei! Fiquei contente. Depois o doutor deu-me uma pica e não vi mais nada”, relata, de forma simples a menina de Nevogilde, Lousada. A mãe, Vera Dias, explica que a menina foi operada à mão devido a uma queda que sofreu aos dois anos e que deixou mazelas num dedo. “Já andávamos a prepará-la, a dizer que vinha para um hotel e que ia ter muitas coisas para brincar. Tinha visto a notícia dos carros mas não sabia que ela ia andar. Foi bom para ela não chorar naquela parte de separar mãe e filha. Ela foi no carro e estava distraída e não houve aquele stress, mesmo para mim porque não a vi a chorar”, reconhece.

Catarina Queirós, do Marco de Canaveses, viu as mesmas vantagens com o Gonçalo. “Eu já lhe tinha dito, vais andar num BMW. Quando ele se queixava de fome eu respondia: ‘espera que vais andar primeiro de carrinho e depois já podes comer’. Andou contente até à hora de ir e sempre ansioso e a perguntar pelo carro. Foi bem até ao bloco. Ia feliz”, descreve a mãe. “O facto de ele ir bem tranquilizou-me a mim. Isto foi uma excelente ideia, ajuda muito”, acrescenta.

Gonçalo, de seis anos, com a mãe

Crianças mais tranquilas e “pedem mais uma voltinha”

Foi a necessidade sentida no bloco operatório que levou à ideia de criar o projecto “Uma aventura sobre rodas”, proposto pela equipa de enfermagem do Bloco Operatório Central à Comissão de Humanização do CHTS.

“A altura da separação entre mãe e criança era sempre de grande ansiedade e muito choro, o que criava também ansiedade na equipa. Quisemos arranjar alguma estratégia para minimizar isso”, refere Paula Guimarães. “Era a mãe a chorar, a criança a chorar, era mais complicado dar a anestesia e a criança também acordava ansiosa e a chorar”, diz.

A ideia foi aceite pela Comissão de Humanização e pelo conselho de administração do CHTS e um parceiro ofereceu os carrinhos.

“Proporcionar às crianças esta oportunidade tem sido bastante gratificante. Não tem havido choro. Vêm nas macas e mal vêem os carrinhos saltam logo para lá, dizem adeus à mãe e vão corredor fora a fazer manobras. Nós ajudamos a controlar o carro com um comando, sobretudo com as crianças mais pequenas”, descreve a enfermeira.

A experiência que temos tido desde que temos os carros é de que adormecem muito mais tranquilos e também ficam mais tranquilos no recobro. Muitas vezes pedem mais uma voltinha de carrinho quando já estão na sala de operações e quando acordam ainda perguntam pelo carro”, assume com um sorriso.

Segundo Paula Guimarães, este projecto foi englobado no projecto Humanizar Mais do centro hospitalar que define várias acções em que o doente é o centro das atenções, fazendo com que a “humanização esteja sempre presente”.