Não foi difícil para Jorge Gomes escrever o livro Sport Clube Nun´Álvares ‘um centenário de memórias’, uma colectividade de Recarei, Paredes. Porquê? Porque quando era criança vivia “a um minuto do campo de futebol” que, na altura, lhe serviu de palco a “inúmeros jogos e brincadeiras”.

Também a escola primário que frequentou era ao lado do campo do Calvário. E recorda que, pela mão do pai, “não perdia um jogo de futebol” e, desde que se conhece, sempre torceu pela equipa da sua terra. Por isso, escrever este livro, lançado no âmbito do centenário, “não foi nada complicado”, porque tem uma ligação afectiva ao clube.

Como “estava por dentro dos pormenores” que constroem todo um passado, ou porque os viveu por os ter ouvido contar pela voz dos intervenientes, explicou ao Verdadeiro Olhar que esta publicação não foi ‘desenhada’ como um relato cronológico, é mais uma história que engloba muitas estórias. E todas elas fazem parte das suas memórias. Assim, este livro traduz-se numa “abordagem pessoal” acerca do clube pelo qual tem uma “grande paixão, revelou o engenheiro electrotécnico.

E é certo que Jorge Gomes fala do Nun´Álvares como se da sua casa de tratasse. No baú das memórias tira o facto de ter herdado este amor do pai que “também tinha uma forte ligação” ao grupo. Aliás, “foi jogador, nas décadas de 40 e 50, e também dirigente”. Por isso, desde que se lembra, o clube entrou na sua vida quando ainda era criança e a prová-lo está o facto de ter tido o seu primeiro cartão de sócio com apenas “dez anos”.

“Foi na sede do clube que assisti à ida do primeiro homem à lua e aos jogos do Mundial de 1970”

E são tantas as recordações que tem, como ter sido dentro daquelas paredes que viu televisão pela primeira vez. Recorde-se que, em 1957, a caixinha mágica começou a dar os primeiros passos em Portugal. “Era a preto e branco”, lembra Jorge Gomes, acrescentando que, e durante muitos anos, ter aquele equipamento em casa era privilégio apenas de alguns. Por isso, ia com o pai à sede do clube, onde assistia a algumas emissões. “A ida do homem à lua”, foi uma delas, assim como os jogos do Mundial de 1970, disputado no México, que sagrou o Brasil como campeão e que representou a consagração definitiva do eterno rei, Péle. Tudo aconteceu nas cadeiras do Nun´Álvares, com memórias que ficaram até hoje e que, agora, foram transpostas para este livro.

Mas esta ligação afectiva não se fica por aqui, porque, desde cedo, se percebeu que desde pequeno mostrava “jeito para o futebol”. Saltou então para dentro do campo, tendo, depois, passado por clubes como “o Paredes, o Valongo” e até o “Boavista”. Saiu porque “tinha que ganhar dinheiro”. Mas este afastamento do clube de Recarei foi apenas físico, porque o seu coração continuou a bater sempre pelo Sport Clube Nun’ Álvares

Depois, estudou, casou e teve filhos e, em 2003, regressou como dirigente. Na altura, viviam-se tempos difíceis devido a alterações impostas aos campos de futebol, pela Associação de Futebol do Porto. Obras eram sinónimo de verbas e foi preciso arregaçar as mangas e lutar para que o clube conseguisse ultrapassar mais um obstáculo. A Câmara Municipal de Paredes da altura ajudou e Jorge Gomes conseguiu aquilo a que se tinha proposto” que passava por dar continuidade a um projecto que, actualmente, envolve centenas de atletas”, frisou ao Verdadeiro Olhar.

Antes de sair do clube como dirigente, também fez parte da criação do departamento de andebol. Tinha três filhas que gostavam de praticar a modalidade, mas tinham que jogar na Maia, por indisponibilidade desta actividade em Recarei. Estas e muitas outras referências fazem com que o autor deste livro não tenha dúvidas em afirmar que “está por dentro da história e de todos os pormenores” relacionados com o Nun´Álvares, por isso, foi com facilidade de transpôs para o papel tantos anos de ‘vida’.

É evidente que, “os 100 anos de história são importantes, mas se não ficarem registados, perdem-se”, porque as memórias vão morrendo, disse ainda, acrescentando que para conseguir concretizar esta publicação contou ainda com “depoimentos de pessoas, sobretudo mais antigas, que também estiveram ligadas ao clube”.

Jorge Gomes lembra que conheceu “dois dos fundadores”, lembrando que a ideia de criar esta colectividade partiu de elementos de “três famílias abastadas de Recarei”: Correia, Carvalho e Moreira são os apelidos dos fundadores que foram uns visionários e conseguiram “ter esta ideia brilhante” de criar este clube, com “estatutos muito bem feitos para a época”, que fizeram com que se mantivesse vivo até hoje.

É evidente que a segunda guerra travou a voracidade do Nun´Álvares, devido ao sistema “político, social e económico” vivido na época, mas, depois, o clube renasceu e fortificou-se, uma situação que tem vindo a acontecer, ano após ano.

Jorge Gomes não deixa de sublinhar o papel de Ricardo Costa, actual presidente do clube, e de toda a equipa que com ele colabora, que tem feito um “trabalho excepcional”, sendo que tem sabido “fazer reajustes”, de forma a que o grupo continue e crescer, saindo sempre “revigorado”.

Nunca podemos esquecer que “as dificuldades financeiras neste tipo de estruturas são permanentes”, mas, e apesar das restrições, “há que cumprir com os compromissos”. Ora, e apesar das dificuldades do dia-a-dia, “tem sido feito um excelente trabalho”, sendo que as crises “fazem com que fiquemos ainda mais fortes”. E é isso que tem, acontecido no Clube Nun´Álvares.

“Este clube fez parte do meu crescimento desportista, emocional e social”

Hoje, quando olha para trás, Jorge Gomes não tem dúvidas em afirmar que foi este clube fez parte do seu “crescimento desportista, emocional e social”. “Os meus melhores amigos nasceram ali” e quando olha para trás vê sempre aquele menino que ia ver os jogos de mão dada com o pai.

Actualmente, os tempos são bem diferentes. O acesso ao desporto nada tem a ver com o de outras épocas, mas as solicitações “também são bem maiores”. “O futebol era quase o único divertimento que tínhamos quando éramos crianças”. Hoje, fruto das tecnologias, “existe algum afastamento” das colectividades e associações. Mas este clube de Recarei tem conseguido “reajustar-se”, mantendo-se forte e com centenas de atletas.

E é bom que assim seja, porque, como defendeu o engenheiro electrotécnico, “nunca foi tão necessária uma componente desportiva na vida das crianças e dos jovens como agora”. Para além de os “tirar do sedentarismo, ensina-os a ser amigos, colegas, a lidar com as alegrias, as tristezas e até as decepções”.

E o Nun´Álvares tem contribuído para invocar o valor educativo do desporto. E promete continuar a fazê-lo, porque quem gosta deste clube não é de desistir e adivinha-se que vai continuar a trabalhar para voltar a colocar no papel mais uma centena de anos de história.