Apresentada por Humberto Brito como uma ideia eleitoralista enquanto candidato à Câmara Municipal de Paços de Ferreira, a construção de uma nova linha ferroviária que servisse o Vale do Sousa ultrapassou o período eleitoral e, com o acordo dos presidentes das Câmaras de Valongo, Paredes, Lousada e Felgueiras, que apresentaram um estudo que atesta a necessidade e o cabimento da nova linha, transformou-se no que pode vir a ser uma reivindicação de toda a região.

Na semana passada, o documento foi notícia no jornal “Público” e logo surgiram reacções extremadas: de um lado, os que dão a construção da linha como certa, como se fosse acontecer dentro de dias; do outro lado, os pessimistas, para os quais a ideia é uma fantasia que jamais será possível alcançar. Importa, por isso, perceber um pouco melhor a proposta.

Primeira pergunta: faz sentido a construção?

Estes pouco mais de 35 quilómetros de linha serviriam uma região onde existem cerca de 30 mil empresas, com a população mais jovem do país e onde a taxa de natalidade ainda é superior à mortalidade. Mas, acima de tudo, é a região mais pobre de Portugal. Quanto ao investimento necessário, é aproximadamente o mesmo que a empresa Metro do Porto vai gastar para fazer uma linha de São Bento à Boavista (onde já existe uma outra). Portanto, talvez não seja esse o maior problema.

Segunda pergunta: é um projecto concretizável?

Partindo dos dados contidos no estudo preliminar, se o Vale do Sousa ficasse na Alemanha ou na Suíça, provavelmente já se estaria a discutir onde e quando começaria a construção, mas, infelizmente, o Vale do Sousa fica num país cuja ferrovia nacional é, provavelmente, o sector mais abandonado pelos sucessivos Governos há mais de 20 anos. Não podemos esquecer que estamos a falar da construção de uma nova linha no mesmo país onde, em 20 anos, o Alfa Pendular, na Linha do Norte, não conseguiu ainda efectuar uma única viagem à sua velocidade de ponta, porque a linha não permite; onde, na Linha da Beira Alta, o comboio é suprimido porque a automotora não tem gasóleo; onde, na Linha do Oeste, nem sempre o comboio sai porque às vezes não há comboios em número suficiente; onde, na Linha do Alentejo, não se sabe a que horas o comboio chega ou parte porque nem sempre há comboios a funcionar em número suficiente.

Esta é a realidade do país que não podemos ignorar quando falamos na construção de uma nova linha, mas isso não quer dizer que os autarcas da região tenham de desistir de um projecto importante para a região, que deve ser transformado em prioridade regional e numa reivindicação junto do Governo central. Para isso, parece-me que se devem envolver e comprometer todas as forças políticas, não só os partidos do poder. Deve haver um compromisso transversal a todos os políticos desta região.

Se esta discussão que agora começou fizer com que os Governos inscrevam no Orçamento do Estado uma verba realista para a modernização ferroviária nacional, já valeu a pena. Se daqui a dez ou 20 anos começarem a construir a linha, terá valido muito a pena esta luta que agora começou. Para isso é necessário que seja um assunto para se levar até ao fim. Demore o tempo que demorar.