Ministério Público aponta “erros graves” e avança com recurso sobre licenciamento de hospital em Campo

Os 10 arguidos foram absolvidos dos crimes de prevaricação, de tráfico de influência e de falsificação de documentos

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Depois de o Tribunal Judicial da Comarca do Porto ter absolvido os dez arguidos acusados e pronunciados pela prática dos crimes de prevaricação, de tráfico de influência (um arguido) e de falsificação de documentos (cinco arguidos) no caso do licenciamento da construção do Hospital de São Martinho, em Campo, Valongo, o Ministério Público anunciou que vai recorrer.

Em causa, lê-se no site da Procuradoria-Geral Distrital do Porto, estão “erros graves na apreciação da prova”.

Recorde-se que entre os arguidos estão um ex-presidente da Câmara de Valongo, Fernando Melo, e um ex-deputado, Agostinho Branquinho.

Apesar de o acórdão, do início de Outubro, ter considerado que “não foi recolhida prova de ter existido influência de um dos arguidos junto do executivo e funcionários camarários, que as vicissitudes apontadas na acusação quanto aos processos de licenciamento estariam relacionadas com lapsos do arquitecto responsável pelo projecto, assim como, a existência de um segundo processo de licenciamento, originado após a conclusão da obra, deveu-se ao procedimento escolhido para reposição da legalidade, face à existência da declaração de utilidade pública”, o Ministério Publico avançou com um alegações de recurso, pedindo “a revogação da decisão” e “a condenação de todos os arguidos e por todos os crimes porque foram acusados”.

“Defende o Ministério Público, em recurso, que o acórdão demonstra desconhecimento dos procedimentos de licenciamentos de obras particulares e demais legislação aplicável, aliado a credulidades e erros graves na apreciação da prova. Sustenta também que o acórdão enferma de vários vícios, designadamente de nulidades, de erros graves de apreciação da prova, apontando ainda que, tendo a acusação detalhado todo o caminho que seguiram ambos os procedimentos de licenciamento, o de 2003 e mais tarde o de 2007, na motivação da sentença o Tribunal nunca mencionou sequer a legislação de licenciamento de obras, os procedimentos que foram incumpridos, e as consequências a nível administrativo e criminal dos factos que o Tribunal entendeu como ‘lapsos’, que são na realidade nulidades daqueles processos de licenciamento”, invoca o MP, citado pela Procuradoria do Porto. “O Tribunal acreditou numa versão sem qualquer fundamento, contrariando prova documental do processo, prova testemunhal e as elementares regras da experiência”, sustenta ainda a mesma fonte.

Em causa está o processo de licenciamento e construção do Hospital de São Martinho, em Valongo. Foram julgados o administrador da sociedade promotora da obra, o então presidente da câmara municipal de Valongo, dois vereadores e três técnicos municipais, o arquitecto e engenheiro responsáveis pelo projecto, assim como um arguido que exercia, à data, funções de deputado.

O licenciamento começou em 2003, para uma construção de quatro pisos, os dois primeiros para uma policlínica e os restantes para escritórios, mas em 2004, o promotor do investimento solicitou ao município de Valongo a declaração de interesse público, com o consequente aumento do índice máximo de construção previsto no PDM – Plano Director Municipal. Para o efeito, descreve o site da Procuradoria-Geral Distrital do Porto, “foi alegada a criação no espaço de um Centro de Noite para idosos, destinado a 20 pessoas, resultante de uma parceria entre o promotor e uma IPSS”.

“Mercê da influência do arguido deputado, este pedido foi aprovado em reunião de câmara em Maio de 2005, com o fundamento de que a construção iria albergar o dito Centro de Noite, sem que fosse exigida qualquer prova da alegada parceria com a identificada IPSS; parceria que nem sequer existia, não havendo qualquer protocolo ou instrumento semelhante, entendimento ou sequer projecto, entre a promotora e a IPSS”, diz o MP.

Acabou por ser construído um edifício com sete pisos, sendo um de cave, sem que houvesse novo licenciamento, “o que foi feito por decisão do promotor, ciente de que o município não colocaria entraves mercê da acção do arguido deputado”. Apesar de este acrescento “de três pisos não licenciados, foram várias as atestações sucedidas por técnicos responsáveis de que a obra fora executada de acordo com o projecto aprovado, nomeadamente na vistoria para efeitos de concessão de licença de utilização, em Novembro de 2006”, cita a Procuradoria.

Em Setembro de 2007, “mesmo sabendo que a obra já estava construída com sete pisos, o promotor deu entrada no município de Valongo a um pedido de ampliação da obra, fazendo, então sim, referência aos sete pisos, como se estes não estivessem já construídos; e que este pedido foi depois tratado e decidido no município de Valongo do mesmo modo, ficcionando-se que a obra ainda não estava construída, com os técnicos a darem parecer e os decisores a deferirem, o que levou à emissão de alvará de obras de ampliação em 10.12.2007 e à emissão de alvará de utilização em 21.12.2007”, recorda a informação divulgada.