Um dos maiores assaltos a bancos de Portugal vai ficar sem culpados. A Polícia Judiciária não conseguiu identificar os autores do furto feito, em Novembro de 2012, às instalações da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo (CCA) de Penafiel e o Ministério Público (MP) decidiu arquivar o processo. Logo de seguida, também ordenou que os bens abandonados pelos ladrões durante a fuga fossem entregues aos respectivos donos. No entanto, nem o MP, nem a CCA, nem tão pouco a agência de Penafiel da Caixa Geral de Depósitos (CGD), que guardou as caixas com os objectos recuperados, querem assumir a responsabilidade de devolver as medalhas, diferentes peças de ouro, moedas de coleção, relógios, talheres em prata, canetas de marca, guarda-jóias e até acções de empresas. Os lesados temem que, perante este diferendo, os seus bens revertam, tal como ameaça um despacho do MP, a favor do Estado.

Banco diz que não tem “sobre tais objectos qualquer direito ou dever”

“Os meus clientes encontram-se admirados com a atitude da direcção da CCA, que continua a fazer tábua rasa dos direitos das pessoas que confiaram na segurança que os seus cofres indiciavam”, refere Albano Teixeira. Este advogado teme, inclusive, que os seus clientes “percam os valores para o Estado”. “Se isso acontecer agiremos em conformidade”, avisa.

O conflito aconteceu após o MP mandar arquivar o processo a 6 de Outubro de 2014 devido à falta de provas. 22 dias depois, o procurador de Penafiel avisou os lesados que podiam levantar os seus pertences no balcão da CGD, mas o gerente desta entidade bancária informou que só o MP, a “entidade com jurisdição sobre os mesmos”, podia levantar os valores em causa.

O MP decidiu, então, que os relógios e peças de ouro fossem levantados por uma funcionária do Tribunal e entregues aos lesados na agência da CGD. Mas o gerente recusou ceder as instalações para que tal acontecesse. “Face aos vários constrangimentos que têm vindo a ser colocados pela CGD”, o MP ordenou que a funcionária levantasse as caixas com os bens recuperados e as restituísse à CCA de Penafiel. Porém, a 10 de Março deste ano, também os responsáveis do banco assaltado recusaram receber os bens. Num primeiro momento, a CCA justificou essa posição com o facto de não ter sido notificada, mas na troca de argumentos que se seguiu com o MP, o banco alegou que não tinha “sobre tais objectos qualquer direito ou dever”. Acrescentou que nos contratos celebrados, a CCA “apenas tinha por obrigação disponibilizar aos seus clientes a utilização do cofre” e que “nunca quem quer que fosse – e muito menos os respectivos proprietários – entregaram [ao banco] qualquer daqueles bens”. A CCA sustentou, igualmente, que o contrato de aluguer dos cofres já tinha cessado, o que faz com que o banco não tenha “qualquer obrigação com os alegados proprietários daqueles bens”. Nem mesmo quando o procurador ameaçou com o pagamento das despesas do depósito dos bens na CGD e com a perda, em favor do Estado, dos objectos ao final de um ano após a emissão do despacho a CCA cedeu. Por isso, mesmo com esse prazo ultrapassado, os clientes da CCA continuam sem poder aceder aos objectos que guardavam no cofre.

PJ não conseguiu identificar autores de assalto que rendeu 4,5 milhões de euros

O assalto à CCA de Penafiel aconteceu na madrugada de 18 de Novembro de 2012, depois dos ladrões terem arrombado as instalações da Cooperativa Agrícola de Penafiel, anexas ao banco. Segundo o relatório da PJ, o grupo fez vários buracos nas paredes e no chão para poder aceder, primeiro, ao interior do banco e, posteriormente, à caixa-forte. O alarme ainda tocou, mas quando um funcionário da entidade bancária se deslocou ao local acompanhado da GNR não levou a chave para entrar nas instalações. E como do exterior tudo parecia calmo regressou tranquilamente a casa.

Já sem pressão, os assaltantes estroncaram 46 cofres individuais e furtaram tudo o que se encontravam no seu interior. Na informação dada à PJ, alguns clientes garantiram que lhes tinha sido furtado, entre dinheiro e objectos de valor, quantias na ordem dos 200 mil, 300 mil e até de 570 mil euros. Tudo somado, foram furtados mais de 4,5 milhões de euros.

Na investigação que se seguiu, os inspectores conseguiram encontrarar apenas a carrinha que o grupo furtou das instalações da Cooperativa Agrícola. A viatura foi entrada em Rebordosa, Paredes, mas estava regada com lixívia, o que impediu a recolha de vestígios.

Como os assaltantes arrancaram o sistema de videovigilância e ninguém assistiu ao furto, a PJ conseguiu apenas suspeitar que os autores do assalto fossem uns homens de nacionalidade estrangeira que operavam a partir de Espanha. Mas sem provas, a investigação foi concluída sem que fosse deduzida qualquer acusação.