Entram um a um em cena. Dizem como se chamam e o que gostam de fazer. E concluem com um “e somos família”. A partir dali brincam com sons que vêm de garrafas, mas também de instrumentos tradicionais e electrónicos, como a guitarra, o cajón, tablets e sintetizadores. Também cantam e dançam num cenário onde uma máquina de fazer pipocas se destaca.

As crianças e jovens da comunidade cigana de Paredes, dos oito aos 18 anos, estão acompanhadas por músicos da Casa da Música do Porto e todo este espectáculo, que subiu ontem ao palco da Casa da Cultura de Paredes e se repete no domingo, foi construído em conjunto, num processo de partilha, contando com várias referências da música cigana, como o gypsy jazz ou a rumba flamenca.

Esta iniciativa está inserida no projecto “Holograma da Casa”, do serviço educativo da Casa da Música, que será replicado nos 17 concelhos da Área Metropolitana do Porto e que conta com a parceria dos municípios. Em todos a meta é a mesma: levar cultura àqueles que normalmente não a têm, quebrar barreiras e preconceitos.

O projecto arrancou em Paredes com o público-alvo a ser a comunidade cigana. O nome do espectáculo diz tudo: ‘Derrubar Paredes. Erguer Paredes’.

“É importante mostrar a cultura cigana”

“É importante mostrar a cultura cigana para as outras pessoas perceberem que somos iguais”. A frase é de Teresa Santos, de 10 anos, e transmite bem a meta do projecto “Holograma da Casa”. Ela e David Vasconcelos, de 11 anos, são dois dos participantes, que acederam a experimentar algo diferente. “Há um bocado de vergonha de estar em palco e de falar no microfone”, confessam, embora garantam que gostariam de voltar a integrar outro projecto semelhante, para mostrarem a sua cultura. “Sou boa a dançar e gosto. Mas só gosto de dançar músicas ciganas. Neste espectáculo danço e toco piano”, descreve Teresa.  

A grande meta deste projecto passa por “permitir o acesso à cultura a populações e comunidades desfavorecidas ou minorias étnicas” que, normalmente, não têm tanto acesso à cultura, refere Jorge Prendas, coordenador do Serviço Educativo da Casa da Música e do Holograma.

“Com cada uma das comunidades desenvolve-se um projecto artístico. O que se vê é resultado de um trabalho colectivo em que são valorizados os saberes das pessoas e o sentimento de pertença. O espectáculo é concebido com a história deles. O que quiseram trazer para palco foi a vida deles, como o carrinho de pipocas, devido à vida muito ligada às feiras e romarias, venda dos balões, do algodão doce. Trouxeram canções que conhecem, a dança, desenvolveram letras de canções. Desta mistura toda nasceu este espectáculo”, explica o responsável.

“Um dos objectivos é a valorização de todos, neste caso o reconhecimento artístico destas pessoas. Queremos que a população venha ver os espectáculos e que olhe para estas pessoas sem preconceitos. Acredito que esta é uma das ferramentas mais poderosas para a inclusão”, argumenta Jorge Prendas, lembrando que além do envolvimento das crianças e jovens houve outros elementos da família a participar e dar ideias.

“Quando nos perguntaram sobre as pessoas que tinham menos acesso à cultura com as quais gostávamos de trabalhar dissemos claramente que queríamos fazê-lo com a comunidade cigana”, justifica Beatriz Meireles, vereadora da Cultura.

“Queremos quebrar estereótipos e estigmas quanto à comunidade e envolvê-los nestes projectos culturais e que façam parte dos públicos culturais que estamos a criar. Para a população de Paredes este espectáculo é importante por uma questão de aceitação desta comunidade”, acrescenta, referindo que a Câmara de Paredes já desenvolve outros projectos direccionados para a comunidade de etnia cigana, notando-se evolução.

Mais espectáculos até segunda-feira

O projecto “Holograma” tem o propósito de abrir a programação da Casa da Música, nos 17 municípios da Área Metropolitana do Porto, “a públicos sem práticas culturais, criando momentos emotivos que os vinculem à música mais erudita, através do acesso a uma programação muito variada e especialmente concebida para o feito”. Será desenvolvido durante dois anos e destina-se ao público em geral. “Serão produzidos concertos e actividades educativas no âmbito de uma programação especialmente concebida para o município em questão, com a qualidade artística e os cuidados de produção que são próprios da Fundação Casa da Música”, diz a organização.

Inseridos neste projecto de Cultura para Todos há, até segunda-feira, mais espectáculos promovidos pela Casa da Música em Paredes.

Hoje já se realizou o concerto “Bebéthoven” para crianças dos três meses aos seis anos. Às 21h30 sobem ao palco da Casa da Cultura Raquel Ralha & Pedro Renato.

Amanhã, dia 2, há o espectáculo “Les Feuilles Mortes”, entre as 10h00 e 11h30. No domingo, dia 3, repete-se o “Bebéthoven”, entre as 10h00 e as 11h30, e às 18h00, o concerto em comunidade Derrubar Paredes. Erguer Paredes. A programação encerra dia 4, pelas 21h30, com os Solistas da Casa da Música.