Pedro Machado

Mesmo depois de reunir com a REN Portgás Distribuição e com a ERSE – Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos, o presidente da Câmara de Lousada, continua a acreditar que os operadores de gás natural estão a cobrar taxas de ocupação do subsolo (TOS) aos consumidores do concelho de forma “abusiva e ilegal”.

Desde Janeiro deste ano que esta taxa é cobrada nas facturas de particulares e empresas quando, garante Pedro Machado, quando o Municipio aprovou a sua aplicação, em 2016, foi no pressuposto de que “não seria repercutida na factura dos consumidores”.

O autarca pondera mesmo avançar para tribunal para que os valores cobrados sejam devolvidos até porque a taxa foi suspensa, pela Assembleia Municipal, em Fevereiro deste ano.

Mas tanto a REN Portgás Distribuição como a ERSE consideram normal a cobrança que está a acontecer.

“Perante os pareceres jurídicos de que já dispomos sobre esta matéria, tudo leva a crer que o Município tenha razão sobre a ilegalidade desta cobrança”

A Câmara de Lousada aprovou, em Dezembro de 2016, a aplicação da TOS com o pressuposto “de que não iria ser repercutida na factura do consumidor”. À época estava em vigor o disposto no art. 85.º do Orçamento de Estado 2017, que previa isso mesmo, sustenta Pedro Machado.

Os valores não foram cobrados aos consumidores lousadenses nem em 2017, nem em 2018, mas, a câmara recebia cerca de 60 mil euros anuais de acordo com o previsto na proposta.

Só que, no início de 2019, a TOS começou a ser cobrada sem que nada fizesse prever ou havendo qualquer informação de uma alteração legislativa neste sentido, acredita o presidente da Câmara.

Para proteger os consumidores, a Assembleia Municipal de Lousada, suspendeu então de imediato a aplicação da taxa, em Fevereiro de 2019, e comunicou a suspensão às entidades competentes, REN Portgás Distribuição assim como junto dos vários operadores. Fez ainda reclamações junto da ERSE e também pediu ajuda à Secretaria de Estado do Consumidor e Secretaria de Estado da Energia.

Apesar disso, as cobranças da referida taxa continuam a ser feitas na factura dos consumidores domésticos e das empresas.

Na última reunião com a Portgás, a concessionária disse à Câmara que a reversão aprovada em Assembleia Municipal só entrará em vigor no próximo ano e que as cobranças que estão a fazer se referem aos anos de 2017 e 2018. “Se achavam que podia ser repercutida porque demoraram dois anos a tomar iniciativa? Se fosse repercutida no imediato, tínhamos logo cancelado porque não foi esse o espírito da nossa iniciativa”, afirma Pedro Machado.

A Câmara não percebe como pode estar a ser cobrada uma taxa que foi extinta e promete avaliar a questão de forma jurídica. Não exclui mesmo a hipótese de ir para tribunal.

O presidente de Câmara já reuniu propositadamente com a ERSE em Lisboa no sentido de encontrar uma solução para o problema. “A ERSE admitiu que a concessionária para além da cobrança que está a fazer, está a acrescentar 20% ao valor cobrado, o que é de todo incompreensível e revelou que noutros pontos do país vários consumidores estão com processos em tribunal contra as concessionárias e operadoras relativamente ao mesmo assunto”, refere o autarca lousadense.

Entre as hipóteses em cima da mesa, estariam a Câmara assumir o valor junto da Portgás, “que alegadamente ainda faltaria cobrar, e estancava já o problema para futuro”. “Depois disso, avançaria a Câmara de Lousada com uma acção junto da concessionária de modo a que os valores sejam devolvidos. Este pagamento que o município estará a considerar não é a admissão de qualquer razão da Portgás, pelo contrário, mas sim uma forma de fazer parar o problema e ser a Câmara, e não os consumidores, a contestar este assunto nos tribunais”, explica.

Se ficar provado que a cobrança é legítima, a Câmara está disposta a devolver os valores recebidos via concessionária. “Mas, perante os pareceres jurídicos de que já dispomos sobre esta matéria, tudo leva a crer que o Município tenha razão sobre a ilegalidade desta cobrança que ignora fundamentalmente a Lei do Orçamento de Estado”, alega Pedro Machado.

“Creio que não podem cobrar uma taxa que estava previsto não ser repercutida logo em 2017 e, depois disso, foi extinta por nós em Fevereiro e continua a ser cobrada retroactivamente. Deverá ser ilegal”, frisa.

Por isso, “este dinheiro terá que ser devolvido aos consumidores, e no limite, para não onerar os lousadenses tentaremos que reverter este processo a expensas do município e depois esgrimimos o assunto nos tribunais”, defende Pedro Machado.

REN Portgás Distribuição diz que cumpre a lei e ERSE que a cobrança retroactiva é normal

Em resposta às questões do Verdadeiro Olhar, a REN Portgás Distribuição, S.A. limita-se a dizer que “sempre actuou no estrito cumprimento do quadro legal em vigor”.  “Em particular, no que respeita à aplicação e repercussão das taxas de ocupação de subsolo, a REN Portgás Distribuição, S.A. cumpre integralmente a legislação aplicável, o disposto no Contrato de Concessão celebrado entre a REN Portgás e o Estado Português e as regras definidas pela Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos”, garante a empresa concessionária.

Já a ERSE, explica que a TOS que está actualmente a ser paga pelos consumidores refere-se ao passado. “De um modo geral, existe um desfasamento de, pelo menos, um ano entre a cobrança da TOS pelos municípios aos operadores das redes de distribuição de gás natural e a sua repercussão por estes operadores nos consumidores do município em causa”, sustenta esta entidade.

“A suspensão deliberada pela Assembleia Municipal de Lousada tem efeitos para futuro e implicará a não cobrança, pelo município, da TOS de 2019 aos operadores de rede de distribuição e, consequentemente, estes não terão a TOS de 2019 para repercutir nos consumidores em 2020”, esclarece a mesma fonte.

À ERSE, cabe “monitorizar a repercussão da TOS, quando exista, de modo a garantir que os consumidores não pagam TOS acima do valor que foi cobrado pelo município ao operador da rede de distribuição. Para este efeito, a ERSE analisa dados auditados por entidades independentes que lhe são remetidos anualmente, até 31 de Outubro do ano seguinte”, explica ainda.

A Entidade Reguladora avança também que, de acordo com o artigo 246.º da Lei do Orçamento de Estado para 2019, o Governo vai proceder até ao final do 1.º semestre deste ano à revisão do quadro legal enquadrador da taxa de ocupação do subsolo em vigor, nomeadamente em matéria de repercussão das taxas na factura dos consumidores.