A Imaculada

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Fernando Sena Esteves

Dezembro começava com dois feriados: o do dia 1 que já não é e o do dia 8 que se mantém. Enquanto no primeiro se comemorava a restauração da independência de Portugal em 1640, no segundo celebra-se a Imaculada Conceição de Nossa Senhora, havendo uma relação entre as duas realidades. D, João, Duque de Bragança, aguardava em Vila Viçosa o resultado da ação dos conjurados em Lisboa, cujo êxito determinou, no dia 15 de dezembro, a sua aclamação, aos 34 anos, como D. João IV, rei de Portugal, em substituição de Filipe III.

D. João IV teve a oposição de algumas pessoas poderosas, mas contava com o apoio generalizado do povo, bem como o de sua mulher, Luísa de Gusmão, a quem se atribuíram ditos sonoros como “antes rainha por um dia que duquesa toda a vida”. E rainha aos 27 anos, assim esteve 16 anos e mais seis como regente. Mas foi a Imaculada Conceição que D. João IV proclamou como verdadeira rainha de Portugal. Na sua investidura como rei colocou a coroa real aos pés de uma imagem de Nossa Senhora, iniciando a prática de substituir a coroação real pela sua aclamação, a qual se manteve durante toda a dinastia de Bragança, até ao séc. XX.

D. João IV procedeu à coroação solene da Imagem de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa como Rainha de Portugal nas cortes de 1646. Justificava tal devoção afirmando que “me fez Deus mercê por sua intercessão, que tomasse posse da Coroa e Ceptro para governar estes meus reinos livres do pesado cativeiro de Castela”. Outras figuras da nossa história reconheceram esta intercessão para com Portugal, como foi o caso de D. Afonso Henriques ter mandado celebrar um pontifical de ação de graças à Imaculada Conceição pela conquista de Lisboa aos Mouros em 1147. Os mesmos sentimentos partilhava São Nuno Álvares Pereira pelas vitórias nas batalhas contra Castela que salvaguardaram a independência de Portugal no séc. XIV. Foi de resto o Condestável quem adquiriu a imagem de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa.

Assim se vê que a crença de que Nossa Senhora foi isenta de todo o pecado, mesmo do pecado original, desde o instante da sua conceção, é muito antiga na Igreja, mas o Papa Pio IX definiu solenemente o dogma da Imaculada Conceição da Virgem Maria no dia 8 de dezembro de 1854, após consultar os bispos de todo o mundo. No dia 11 de fevereiro de 1858 deu-se a primeira das 18 aparições a Bernardete Soubirous, de 14 anos, em Lurdes. Na 16ª aparição, a 25 de março, a pequena pediu por três vezes à Senhora que lhe dissesse quem era, mas não teve como resposta mais que um sorriso, Insistindo uma quarta vez, a Senhora ficou séria e respondeu no dialeto local: “Que soy era Immaculada Councepciou”. Bernardete correu a casa do pároco e antes mesmo de o cumprimentar exclamou “Que soy era Immaculada Councepciou”. “O quê?! Tu és a Imaculada Conceição?!” “Não sou eu, é a Senhora que me disse o nome.” “E tu sabes o que isso quer dizer?” Perante a negativa, acrescentou que certamente se enganara no que ouvira. Mas a pequena insistiu que tinha vindo pelo caminho a repetir aquilo para não se enganar. Finalmente o pároco aceitou a verdade das aparições e já nem sentia a necessidade de mais prodígios ou milagres.

Portugal atravessa momentos difíceis e há dias mandaram-me uma mensagem eletrónica a propor que se rezasse pelo nosso País a mais antiga oração que se conhece a Nossa Senhora, encontrada num pergaminho do séc. III. Confesso que me senti algo envergonhado por não a saber de cor. Reenviei a mensagem a vários amigos e lembrei-me de deixar aqui também essa prece e o mesmo pedido,

À vossa proteção nos acolhemos, Santa Mãe de Deus. Não desprezeis as nossas súplicas em nossas necessidades, mas livrai-nos sempre de todos os perigos, ó Virgem gloriosa e bendita!