Em 2022, 66% dos resíduos que foram depositados nos dois aterros da Ambisousa, em Lousada e Penafiel, eram “potencialmente recicláveis”, ou seja, podiam ter sido encaminhados para o circuito da recolha selectiva, diminuindo a quantidade de resíduos que vai parar a aterro.

Apesar de ter sido batido um “recorde” de reciclagem no ano passado, só 9% do lixo produzido nos seis concelhos do Vale do Sousa é encaminhado para reciclar.

Numa curta entrevista, Daniel Lamas, responsável pelo Departamento de Monitorização Ambiental, Estudos e Projectos de Recolha Selectiva da Ambisousa, realça estes resultados e os aumentos conseguidos desde que a empresa intermunicipal assumiu a recolha selectiva – “Em quatro anos, de 2018 a 2022, cada cidadão passou a reciclar mais 10 kg/ano” -, mas admite que há ainda um longo caminho a percorrer.

Parte da solução passa por retirar os bio-resíduos de aterro – são 40% -, sendo que para isso já está a ser construída uma unidade em Paredes.

A Ambisousa também vai implementar a recolha selectiva porta-a-porta trifluxo (papel, vidro e plástico). Questionado sobre possíveis incentivos à reciclagem, Daniel Lamas refere que terá de ser cada concelho a avançar e que este projecto já vai permitir identificar os resíduos provenientes de cada habitação. Concorda que é importante que a população seja compensada por reciclar “para que as pessoas sintam verdadeiramente que a sua atitude lhes traz vantagens”.

O ano de 2022 foi aquele em que mais resíduos selectivos se recolheram nos seis concelhos do Vale do Sousa, batendo-se novo “recorde” e sendo o ano que os habitantes mais reciclaram. Como se conseguem estes resultados? Que estratégias foram implementadas nos últimos anos?

Julgo que os dados reflectem acima de tudo uma maior consciencialização da população para a necessidade de se reciclar mais e de evitar o envio de resíduos para aterro.

Desde que a Ambisousa assumiu a recolha selectiva verifica-se precisamente um aumento gradual das quantidades recolhidas de papel, vidro e plástico e um contínuo abrandamento ao nível do envio de resíduos para aterro. No ano de 2022 verificou-se mesmo uma redução de 2%, face a 2021, ao nível das entradas em aterro.

A estratégia da Ambisousa assenta num alargado conjunto de objectivos e iniciativas assumidas com os seus municípios, entre as quais a densificação da rede de ecopontos, a implementação de projectos de recolha porta-a-porta ou o alargamento da recolha selectiva em estabelecimentos HORECA (HOtéis, REstaurantes e CAfés) e pequeno comércio. A Ambisousa tem vindo a implementar estas iniciativas, monitorizando os respectivos resultados, permitindo ajustar as mesmas com vista a uma maior eficiência e qualidade do serviço prestado.

Para estes resultados também contribuiu o facto de a empresa ter assumido a gestão da recolha selectiva? Que balanço fazem?

Sim, sem dúvida. A Ambisousa iniciou a recolha selectiva em Junho de 2019 nos municípios de Castelo de Paiva, Paredes e Penafiel. Em Fevereiro de 2020 alargou este serviço aos restantes municípios, designadamente Felgueiras, Lousada e Paços de Ferreira.

Foram logo implementadas medidas, com vista a uma maior produção e a uma maior eficiência do serviço prestado, tais como: reforço de novos ecopontos; disponibilização em estabelecimentos escolares de contentorização adequada; deslocalização de equipamentos cuja produção era inexistente para locais de maior produção; optimização de circuitos de recolha existentes, com aumento da respectiva frequência de recolha; alargamento do número de recolhas em estabelecimentos do pequeno comércio, entre outras.

Em termos de resultados, logo no ano de 2020, comparativamente com 2019, registaram-se aumentos em todos os municípios e em todos os fluxos (papel, vidro e plástico). Em termos globais, atingimos aumentos de 40% no papel, de 39% no vidro e de 20% no plástico, quantidades recorde na Ambisousa.

Esta performance permitiu-nos mesmo superar a meta de 32 kg/habitante.ano que a Ambisousa tinha definida no PERSU 2020 para a recolha selectiva. Em 2020 conseguimos chegar aos 35 kg/habitante.ano, ou seja + 7kg/habitante.ano do que no ano anterior à Ambisousa iniciar este serviço (2018). Esta meta era, aliás, um dos objectivos que a Ambisousa tinha quando assumiu este serviço, a qual foi superada.

Em 2021 e 2022 continuaram a verificar-se aumentos nas recolhas selectivas, face aos anos anteriores. Em 2022, a capitação de recolha selectiva foi de 38 kg/habitante.ano.

Em quatro anos, de 2018 a 2022, cada cidadão passou a reciclar mais 10 kg/ano. Os números falam por si.

Que investimento é que isso exigiu e quantas pessoas foram contratadas?

Em termos de investimentos, contabilizando contentorização e viaturas, bem como os investimentos já realizados no projecto-piloto de recolha porta-a-porta que estamos a iniciar, estamos a falar de um valor na ordem dos 2,5 milhões de euros.

Actualmente, temos 52 trabalhadores afectos à recolha selectiva e um total de 25 viaturas (10 camiões pesados de 26 toneladas, 11 carrinhas de 3,5 toneladas, três camiões de 12 toneladas e um lava ecopontos).

O desempenho da Ambisousa tem vindo a ser reconhecido. A Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR) distinguiu a Ambisousa com o Selo de Qualidade dos Serviços de Gestão de Resíduos Urbanos 2022, no âmbito do trabalho desenvolvido ao longo do ano de 2021. Esta iniciativa visa distinguir as entidades gestoras de resíduos urbanos que mais se destacaram e apresentaram o melhor desempenho em 2021.

A Ambisousa foi também distinguida pela Sociedade Ponto Verde (SPV) na campanha “Valor Vidro + 2022”, dado que foi registado um aumento de 4,6% do vidro da recolha selectiva. Fomos ainda premiados pela Tetra Pak,no âmbito do concurso “Melhor Desempenho, Mais Reciclagem”, devido a crescimentos na ordem dos 29% nas embalagens Ecal.

O último relatório mostra, no entanto, que, apesar de terem sido atingidos valores recorde, ainda só 9% dos resíduos são reciclados na região. Como justifica estes números? 91% dos resíduos (mais de 134 mil toneladas) a irem para aterro não é um valor muito elevado?

É de facto um valor extremamente elevado, acima da média nacional (53%) e revela que há ainda um grande caminho a percorrer, especialmente no que toca aos bio-resíduos, que são cerca de 40% dos resíduos depositados em aterro.

Quando falamos de bio-resíduos estamos a falar de restos alimentares e de resíduos verdes, os quais são também considerados como fracções recicláveis.

Esta problemática é transversal a todos os sistemas e a estratégia que o país e a Comunidade Europeia estão a fazer ao nível dos bio-resíduos, separando-os na origem, recolhendo-os selectivamente e valorizando-os, permitirá abandonar a forte dependência do aterro sanitário. 

A partir de Janeiro de 2024 será obrigatória a recolha selectiva dos bio-resíduos e a Ambisousa, em colaboração com os seus municípios, está a delinear um plano de acção para dar resposta a este enorme desafio: separar, recolher selectivamente e valorizar (criando gás natural e composto a para agricultura) na futura unidade de valorização orgânica. Há, portanto, um sério desafio pela frente.

Qual a percentagem de resíduos que vai parar a aterro mas poderia ser encaminhada para reciclagem?

De acordo com o último relatório de caracterização dos resíduos (2022), cerca de 66% dos resíduos depositados em aterro são potencialmente recicláveis. Refiro-me a bio-resíduos, papel, vidro, plásticos, metais, madeira, resíduos eléctricos e electrónicos, bem como pilhas e acumuladores.

Quais as medidas previstas para aumentar a percentagem de resíduos recicláveis encaminhados para as estações de tratamento no futuro? Vai haver novo aumento do número de ecopontos?

Será feita uma aposta na recolha selectiva de bio-resíduos, inicialmente em grandes produtores e, numa fase seguinte, em proximidade à população. E também a implementação da recolha selectiva porta-a-porta trifluxo (papel, vidro e plástico), bem como aumento do número de ecopontos.

O concelho de Lousada, por exemplo, alcançou um elevado crescimento do número de quilogramas recolhidos por capita nos últimos anos com a ajuda de uma campanha de descontos na factura da água, caso se entregassem recicláveis no ecocentro. A Ambisousa está a ponderar arranjar forma de dar incentivos financeiros a quem reciclar? Ou terá de ser cada concelho a adoptar uma solução? 

Julgo que terá de ser cada concelho a adoptar uma solução, dado que a Ambisousa não factura serviços directamente aos munícipes.

O ponto-chave na atribuição destes incentivos está na identificação rigorosa de quem recicla, qual a habitação em causa.

Neste campo, a Ambisousa está actualmente a iniciar um projecto de recolha selectiva porta-a-porta trifluxo (papel, vidro, plástico) em zonas piloto, o qual poderá dar aqui algum contributo. Às habitações que se encontram dentro destas zonas e que pretendam aderir ao projecto é-lhes disponibilizado uma bateria de três contentores de 120L, um para cada fluxo, no qual a Ambisousa procede posteriormente à recolha dos mesmos, em dias diferenciados. Cada um destes contentores está identificado com um chip RFID, o qual permitirá depois na descarga na viatura saber a que habitação correspondem. Ficaremos a saber, por exemplo, quantas vezes o contentor de plástico da habitação X foi colocado para recolha, permitindo depois determinar a respectiva quantidade de cada um. Teremos assim quantidades vs habitações, contribuindo para a atribuição de eventuais incentivos ou prémios, etc.

É muito importante as pessoas que reciclam sejam compensadas por isso, que sintam verdadeiramente que a sua atitude lhes traz vantagens.

Quais são as metas de reciclagem da Ambisousa para os próximos anos?

Haverá certamente um maior foco na recolha selectiva de bio-resíduos, no atingimento de uma meta de 25.000 toneladas anuais (20.000 toneladas de resíduos alimentares e 5.000 toneladas de resíduos verdes). Esta é, aliás, a capacidade da futura unidade de valorização de resíduos orgânicos da Ambisousa, actualmente em construção na zona industrial de Parada-Baltar, Paredes.

Julgo também que a recolha selectiva porta-a-porta será o futuro, dadas as quantidades e a qualidade do material recolhido, aliado às características habitacionais predominantes no Vale do Sousa e aos efeitos de economia de escala e ganhos de eficiência que se podem alcançar.