Os vereadores eleitos pelo PSD votaram contra a proposta de resgate da concessão de água e saneamento à Be Water- Águas de Paredes e criação de um serviço municipalizado. Em reunião de executivo, justificaram que não concordam com o caminho escolhido pelo executivo socialista. “Se há uma violação clara por parte da Be Water propomos que não se faça um resgate da concessão, mas uma rescisão de contrato por justa causa”, apelou Rui Moutinho.

“O que estamos a fazer é rescisão. (…) Mas ao fazer a rescisão temos de indemnizar. Isso contratualmente está previsto e há regras a cumprir”, declarou o presidente da Câmara.

O processo de resgate, estimado em 22,5 milhões de euros, foi aprovado apenas com os votos dos eleitos do PS. A Be Water tem agora 10 dias para se pronunciar.

Recorde-se que Alexandre Almeida anunciou, na semana passada que ia avançar com o resgate, já que a concessionária não tem feito os investimentos previstos no contrato, deixando o concelho com uma cobertura de saneamento de apenas cerca de 40%. A exploração passará a ser feita por um Serviço Municipalizado de Água e Saneamento (SMAS) que, segundo a autarquia, vai investir 33 milhões de euros na conclusão das redes de água e saneamento no concelho até 2036.

PSD fala em condicionamento dos órgãos decisores

Numa reunião de executivo com 72 pontos, o que criou debate foi o número 28, que visava o exercício do direito de resgate da concessão da exploração e gestão dos sistemas de abastecimento de água para consumo público e de recolha, tratamento e rejeição de efluentes do concelho de Paredes e criação dos serviços municipais de águas e saneamento.

“Está a confundir a apresentação de propostas com a decisão”, começou por dizer Rui Moutinho, aludindo ao facto de, apesar de ter contactado o PSD para dar nota de intenção de resgate, o autarca ter avançado para uma conferência de imprensa onde anunciou a decisão, ainda antes de passar pelo debate da reunião de câmara e da Assembleia Municipal. “Este é um claro condicionamento e para não dizer desrespeito pelos órgãos que tomam decisões”, criticou o vereador social-democrata.

O eleito do PSD deixou depois um conjunto de 10 perguntas e pedidos de esclarecimento, nomeadamente: “qual foi afinal a proposta apresentada pela Câmara à Be Water, uma vez que era público e reiteradamente disse que haveria já um acordo com a empresa quanto ao contrato de concessão e se em função dessa proposta houve alguma contra-proposta da Be Water?”, “de que forma foi calculado o valor como sendo necessário ao resgate?”, “consegue de facto garantir  aos paredenses que esse será o valor a pagar pelo resgate e não outro? Até porque no passado já se falou do valor do resgate e rondaria os 80 milhões de euros”, “se for decidido o resgate qual é a calendarização com que o senhor presidente se compromete para dotar de saneamento as freguesias que não têm, nomeadamente as do sul do concelho?”.

Rui Moutinho questionou também se foi verdade que na apresentação de uma candidatura ao programa Life, para saneamento em Recarei e Sobreira, foi afirmado que não existia concessão naquele território e como é que a Câmara se pretende financiar em 23 milhões de euros já que este executivo sempre disse que o município não tinha capacidade de endividamento. Concluiu perguntando qual a opinião de Alexandre Almeida sobre o grau de incumprimento do contrato por parte da Be Water.

“Vamos privilegiar o diálogo e a via negocial. Penso não ser necessário ir a tribunal com a Be Water”, alega presidente

À oposição, o presidente da autarquia explicou, como já tinha feito quando anunciou o resgate, que foi a Be Water que, em 2019, comunicou que o contrato da concessão estava desequilibrada e tinha de haver um novo aditamento, que implicava aumentos tarifários e a alteração do perímetro concessionado, ficando de parte quatro freguesias do sul do concelho. Lembrou que o anterior executivo tinha concordado, no anterior aditamento, um aumento de 70% nos preços da água entre 2008 e 2018. Mas o município já não realizou os aumentos previstos em 2016 e 2018 já que a concessionária também não estava a cumprir o cronograma de investimentos acordado, de 35 milhões de euros até 2036. Até 2019, o investimento da Be Water ficou-se pelos 3,7 milhões de euros.

Alexandre Almeida salientou que até poderiam concordar com a alteração de perímetro, passando o município a investir nas freguesias do sul do concelho onde existem subsistemas de água. O problema é que a concessionária só previa 2,5 milhões de euros de investimento, que seriam para manutenção da rede e não para resolver o défice de saneamento que existe um pouco por todo o território. Ao PSD, disse ainda que o acordo com a concessionária não foi possível pelos aumentos previstos para os próximos anos.

Quanto aos cálculos, respondeu, estão previstas no contrato as fórmulas que permitiram chegar ao resgate por 22,5 milhões de euros. “Eles agora têm direito a audição e poderão vir pedir o valor que quiserem, mas a haver variação deste valor será residual. Eles não fizeram os investimentos”, atestou o autarca. “Vamos privilegiar o diálogo e a via negocial. Penso não ser necessário ir a tribunal com a Be Water. Mas foi ela quem primeiro incumpriu”, ressalvou.

Sobre a calendarização do saneamento, o autarca reafirmou que querem fazê-lo entre 2022 – depois de todos os trâmites do processo de resgate – e 2036, através dos serviços municipalizados. Diz-se ainda convicto de que haverá fundos comunitários para executar as obras. Mesmo o SMAS fazendo um investimento de 33 milhões de euros, ainda haverá retorno para abater ao empréstimo. “Já estamos a fazer saneamento que a Be Water não faz”, sustentou Alexandre Almeida, dando como exemplo a ligação da A41 à zona industrial de Rebordosa. Na candidatura do programa Life, não houve nenhuma omissão sobre a existência de uma concessionária, garantiu.

O financiamento para conseguir este resgate não fará a Câmara de Paredes ultrapassar os limites de endividamento, porque o Orçamento de Estado contempla estes empréstimos excepcionais para bens essenciais.

“Romper com o contrato é a melhor solução”, mas PSD não concorda com a forma

Depois de cinco minutos de intervalo para debater o tema, os vereadores do PSD apelaram a um processo diferente.

“Pelas explicações dadas, mais convictos estamos de que de facto houve um total incumprimento por parte da Be Water com o contrato de concessão. Estamos plenamente convencidos de que a Be Water prejudicou os paredenses de diversas formas porque não cumpriu com o contrato de investimento e deixou à sua sorte grande parte do território municipal”, afirmou Rui Moutinho, defendendo que “romper com o contrato é sem dúvida alguma a melhor solução”.

“Mas estamos em crer que este não é o caminho mais adequado. Se há uma violação clara por parte da Be Water propomos que não se faça um resgate da concessão, mas uma rescisão de contrato por justa causa. Não deve ser dada uma vantagem por não ter cumprido”, argumentou o vereador do PSD.

Se o investimento da concessionária rondou os 27 milhões e ainda houve rendimentos do serviço prestado, os social-democratas não concordam que ainda sejam dados 23 milhões de euros dos bolsos dos munícipes.

“O que estamos a fazer é rescisão. Foi feito um negócio em que entregamos o serviço e agora entendemos que não estão a cumprir e estamos a retomar esse serviço. Ao fazer a rescisão temos de indemnizar. Isso contratualmente está previsto e há regras a cumprir, e para se garantir que isto se faz no mais curto espaço de tempo temos de cumprir as regras”, alegou o presidente da Câmara. “Caso não haja acordo e queiram ir para tribunal os incumprimentos serão postos em cima da mesa e vamos defender os interesses dos paredenses”, justificou.

Mas o PSD votou contra a proposta apresentada, que foi apenas aprovada com os votos dos eleitos socialistas.

Seguiram-se declarações de voto, em que o PSD teceu críticas de carácter mais político. “Fica aqui demonstrado que quer o PSD quer os paredenses andaram a ser enganados pelo PS. Nas várias reuniões recorrentemente disse que estava para muito breve e bem encaminhado o acordo com a Be Water para que nas freguesias onde existem os subsistemas de água a Câmara passasse a ter competências no saneamento. Disse até que o acordo com a Be Water estava conseguido e só faltava o parecer da ERSAR. Isso não aconteceu e, mais grave, a concessionária não cumpre com os investimentos deixando uma grande porção do território sem saneamento, apenas investindo nos grandes centros urbanos onde o rendimento é maior e o custo menor”, afirmou Rui Moutinho.

“Coragem política”, diz o PS

O líder da bancada social-democrata apontou ainda a “falta de capacidade da câmara” para fiscalizar os incumprimentos e o facto de este processo ainda adiar mais os investimentos necessários. “Se o resgate só se tornará eficaz em 2022 e com um investimento de 23 milhões de euros no resgate não sabemos quando a câmara terá capacidade para fazer investimentos nesta matéria”, referiu.

“O PSD considera que devia sim resolver-se o contrato e não optar-se pelo resgate, dando dinheiro à concessionária que viola o contrato e deixa sem saneamento grande parte do concelho. (…) Esta será uma decisão vossa”, frisou, acrescentando que o PS “qual salvador da pátria” prometeu que resolvia o problema num mandato e nada fez.

Também em declaração de voto pelos socialistas, o presidente da Câmara disse que houve “coragem política” para resolver um problema que se arrastava. “Todos reconheceram que houve incumprimento, que a Be Water prejudicou o concelho e não fez os investimentos que devia fazer. Essas são as razões do interesse público que permitiram de forma estudada e consciente avançar com o pedido de resgate”, elencou.

“A continuarmos a ter um executivo PSD, com este sentido de voto, percebemos que tudo ia continuar na mesma, uma empresa privada a explorar a água e saneamento no concelho e sem fazer os investimentos a que está comprometido”, criticou ainda, perante o voto contra da oposição.