Coelho da Rocha entende que a eleição de Mário Duarte para o PSD Valongo serve para ‘tudo ficar como está’, com Trindade Vale a manter a sua influência, p. ex. com a Comissão Política repleta de colaboradores da ADICE. É verdade que não conhecemos o projeto político, nem a estratégia ou visão de Mário Duarte, mas quero acreditar que o diretor deste jornal não tem razão.

 

Quando Tancredi lhe comunicou que se preparava uma revolução liberal que abalaria o regime, o Príncipe de Salina entregou-lhe um rolo de onças de ouro. Apresentando sinais do tempo que já durava e encontrando-se em fase decadente, o regime suportava o poder que o Príncipe ainda detinha. O descontentamento era crescente e os sinais de que alguma mudança iria ocorrer eram evidentes.

A passagem mais conhecida da obra onde se desenrola esta narrativa prende-se com o momento anterior à entrega das onças de ouro, em que Tancredi, sobrinho do Príncipe, lhe diz: Se nós não estivermos lá também, aqueles ainda se saem com a República. É preciso que tudo mude, se quisermos que tudo fique como está. Expliquei-me bem?.[1]

Recordei-me da história que nos traz Giuseppe Tomasi di Lampedusa em O Leopardo a propósito da interpretação que Francisco Coelho da Rocha faz da eleição de Mário Duarte para a Comissão Política de Valongo do PSD.[2] O Diretor deste jornal imputa uma mera troca de cadeiras entre protagonistas, com Maria Trindade Vale a passar para presidente da Mesa do Plenário, mas mantendo a sua influência, nomeadamente com a integração na Comissão Política de colaboradores da ADICE, associação a que aquela preside.

Como militante preocupado com o partido, quero acreditar que Coelho da Rocha não terá razão. Sendo este o caso, estou certo que o novo presidente da Comissão Política irá esclarecer que as dúvidas levantadas não se justificam. Mais do que isso, estou certo que os factos e o tempo irão demonstrar que quando Mário Duarte afirma que pretende unir e ressuscitar o partido, não está apenas a acompanhar o pensamento do Príncipe de Salina:

[T]empos gloriosos para a nossa Sicília (…) que nos foi prometido por ocasião de cada um dos cem desembarques, de Niceia em diante, e que nunca sucedeu. E, de resto, porque deveria suceder? E então o que acontecerá? Negociações sublinhadas por tiros quase inócuos e, depois, tudo ficará na mesma enquanto tudo mudará”.[3]

É verdade que não conhecemos o projeto político de Mário Duarte para o PSD de Valongo. Não conhecemos as aspirações, a estratégia e a visão que o novo Presidente terá para o futuro de Valongo. Mas, a sua eleição significará mais do que a posição do Príncipe de Salina, que se justificava: “Não somos cegos, caro padre, somos apenas homens. Vivemos numa realidade movediça a que tentamos adaptar-nos tal como as algas se vergam sob os empurrões do mar”.[4] Quero acreditar que Coelho da Rocha está a ser injusto quando presume que o PSD não está a preparar o caminho, seja para tentar melhorar o resultado no concelho nas próximas eleições, seja a tentar derrotar os socialistas daqui a cinco anos.

O PSD, que já muito deu, tem ainda muito a dar ao concelho. Mário Duarte tem a experiência para contribuir para que tal suceda e teve a oportunidade de escolher a equipa que melhor contribuirá para isso. Desejo que assim seja.

O Príncipe de Salina contribuiu para que tudo ficasse como estava. Mas, chegou ao final da vida e concluiu: “Tenho setenta e três anos, por alto devo ter vivido, realmente vivido, um total de dois… três no máximo”.[5] O PSD tem muito que viver.

[1] GT Di Lampedusa, O Leopardo (D. Quixote, 2014), pág.42

[2] https://verdadeiroolhar.pt/2020/09/18/danca-cadeiras-no-psd-valongo/

[3] GT Di Lampedusa, O Leopardo (D. Quixote, 2014), pág.46

[4] Id., pág.52

[5] Id., pág.214