Kateri Tekakwitha

0

A viagem do Papa Francisco ao Canadá começou na sexta-feira 22 de Julho com uma ida em cadeira de rodas à basílica romana de Santa Maria Maior, para rezar diante da imagem de Nossa Senhora. É sempre esta a primeira e a última etapa de uma viagem do actual Pontífice. No meio, de 24 a 30 de Julho, será a viagem propriamente dita ao Canadá.

O Canadá, conhecido pela beleza natural e pelo desenvolvimento social e económico, está cheio de desafios para a Igreja, pela agressividade sexual, a decadência de costumes e, como se não bastasse, pela consciência recente de que houve prepotências durante a primeira evangelização.

A vida cristã não é fácil. A intolerância do Estado Canadiano vai ao ponto de não reconhecer sequer o direito à objecção de consciência, mesmo em matérias sensíveis, como a recusa a colaborar num aborto, ou num casamento homossexual, ou a recusa a provocar a morte de uma pessoa idosa ou doente. A militância anticristã impede praticamente que um cristão, em particular um católico, ocupe lugares destacados na sociedade. Cerca de 40% da população sente afinidade com a Igreja católica, mas a falta de assiduidade à Missa dominical, à Confissão e aos outros sacramentos é dramática: o país que o Papa visita requer um fôlego renovado de evangelização.

Por outro lado, alguns descendentes das tribos nativas acusam a Igreja católica e as igrejas protestantes de terem procurado converter os seus antepassados à força. A história não parece simples. Houve prepotência de uns europeus e generosidade de outros europeus. Por vezes, os que procuraram ajudar as populações pobres foram pouco compreensivos da sensibilidade local. A mesma pessoa fez coisas edificantes e coisas más. Houve de tudo, naquele país disperso por milhares de quilómetros de florestas e paisagens geladas. A principal queixa é que, para ajudar as populações nativas, o Governo canadiano promoveu, a partir de 1870, uma rede de 130 colégios internos que ficaram ao cuidado de diversas entidades, nomeadamente anglicanas e protestantes, mas também, pelo menos uma dúzia, orientados por católicos. Apesar da boa intenção, houve várias falhas nesses 130 colégios internos para nativos. Frequentemente, acolhiam crianças retiradas aos pais, forçadas a ir à escola, a disciplina era demasiado severa, os colégios eram demasiado pobres, o ensino era deficiente e transmitia às crianças nativas a ideia de que a sua cultura de origem não tinha valor.

No Domingo passado, o Papa resumiu assim este tema central da sua viagem:

— «Infelizmente, no Canadá, muitos cristãos, incluindo alguns membros de institutos religiosos, contribuíram para políticas de assimilação cultural que, no passado, prejudicaram gravemente as comunidades nativas, de várias formas. Por esta razão, recebi recentemente no Vaticano alguns grupos, representantes dos povos indígenas, a quem manifestei o meu pesar e solidariedade pelos danos que sofreram. E agora preparo-me para empreender uma peregrinação penitencial que espero, com a graça de Deus, contribua para o caminho de cura e reconciliação já empreendido. (…) Peço-vos que me acompanheis em oração».

Que seria de nós sem os santos, no meio dos conflitos culturais? O Canadá tem vários santos missionários e mártires e começa a ter santos autóctones. A primeira é Santa Kateri Tekakwitha, uma rapariga da tribo dos Mohawk, cuja vida resume a turbulência da época.

Uma epidemia de varíola dizimou a família e ela sobreviveu, mas ficou com marcas na cara. Foi recolhida na tribo, acompanhada por outros índios, uns católicos, outros não, até que aos 19 anos entrou em contacto com uma missão, decidiu formar-se e receber o baptismo. Quando tinha 10 anos, o exército francês atacou a aldeia dos Mohawk, destruiu tudo e obrigou-os a refugiarem-se numa floresta gelada do Norte. Quando tinha 13 anos, centenas de guerreiros Mohican cercaram a aldeia com grande violência, mas a defesa conseguiu chamar reforços e os atacantes acabaram largamente dizimados e torturados. O líder da defesa converteu-se ao catolicismo. Parte da aldeia converte-se, outros proíbem os filhos de se aproximar das missões. Kateri Tekakwitha vence a oposição dos familiares, consegue baptizar-se e… é hoje a primeira santa de uma tribo nativa do Canadá.

Por intercessão de santa Kateri Tekakwitha, que Deus acompanhe o Papa nesta sua viagem.