Boa morte?

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O direito à vida é o primeiro de todos os direitos humanos e quando se põe em causa fragilizam-se ou perdem mesmo significado esses direitos. É o que poderá acontecer se vingarem as iniciativas de se legalizar a eutanásia, expressão que significa boa morte, morte por compaixão, ou coisa semelhante.

Só que a morte direta de um inocente é sempre uma morte péssima por parte de quem a sofre e por parte de quem a promove. Pode tolerar-se a morte de inocentes se for indireta mas nunca como meio ou como fim em si mesma. É o caso de uma mulher grávida com um tumor maligno cuja ablação tenha como consequência inevitável a norte do filho. Assinale-se, no entanto, a decisão heroica de mães nesta situação, que preferiram a evolução da doença e a sua própria morte para salvar a vida do filho. Como também é tolerável a morte de civis quando um beligerante, travando uma guerra justa, bombardeia alvos militares, desde que sejam proporcionados a importância de tais alvos e o número previsível de baixas civis.

Para justificar a prática da eutanásia, pretende-se limitá-la aos casos de doença incurável e com sofrimento intolerável, e com várias salvaguardas como a de pareceres médicos, etc. Só que bem se sabe como estas coisas começam ao violarem-se princípios invioláveis e no que resultam de seguida. Basta pensar nas iniciais restrições com que se aceitava o aborto – perigo de vida para a mãe ou casos de violação – e na prática que se lhe seguiu, a da tal “livre escolha” da mãe sem ter de invocar motivo algum. Não é necessária muita imaginação para ver no que a morte “por compaixão” dará a breve trecho, com a morte de idosos ou de doentes “complicados” mesmo jovens, para a simples descomplicação dos familiares, passando até pela desejável antecipação de heranças, porventura acompanhada de uma percentagem encorajadora de parecer “médico” se tal ainda for preciso.

Tudo práticas que ignoram os cuidados paliativos e o carinho que merecem os que sofrem por parte dos familiares. Quando não mesmo acompanhadas de sentimentos economicistas por parte dos governantes por quererem poupar recursos ao abreviar a vida de doentes terminais. Ou a classificação falaciosa de “eutanásia passiva” à medida legítima de suspender meios extraordinários para a manutenção de funções vitais ou o chamado encarniçamento terapêutico, deixando prosseguir naturalmente o curso da doença incurável.

Outro efeito preverso da eutanásia legal é o do sentimento de insegurança do doente ou do idoso que pode bem interrogar-se, mesmo só para si, se o internamento hospitalar que a família lhe recomenda com tanta insistência, tem como fim cuidar da sua saúde ou simplesmente “eutanasiá-lo” por entenderem que já viveu que chegue. Bem se lembra quando em miúdo fazia na praia uma barragem de areia acumulando água que escorria para o mar. E como, ao fazer um buraquinho na barragem, rapidamente ficava um buracão e depois de rápida enxurrada, da barragem… nem vestígios ficavam.

Nestes tempos em que se rejeita – e muito bem – a pena de morte para os criminosos, bom seria que a pena de morte se não instituísse para mais uma classe de inocentes. Eutanásia, morte boa? Não, morte péssima. Eutanásia? Não, obrigado!