A Câmara de Paços de Ferreira anunciou, hoje, em conferência de imprensa, que vai avançar com a rescisão do contrato de concessão de água e saneamento “por justa causa”.

De acordo com o presidente da autarquia, Humberto Brito, há um conjunto de “incumprimentos legais e contratuais” que sustentam esta decisão, sobretudo uma “grave violação” por parte da concessionária.

“Há um motivo que conduz necessária e inevitavelmente à rescisão com justa causa, designadamente a alienação da concessão, sem que que tenha sido dado qualquer conhecimento ao município de tal circunstância, fazendo tábua rasa da lei e do contrato”, invocou. A concessão terá sido vendida a um fundo de investimento.

“O executivo municipal desencadeará, de imediato, os necessários procedimentos no sentido de fazer valer todos os direitos que assistem ao Município de Paços de Ferreira, designadamente fazendo operar a rescisão, com justa causa, do contrato de concessão, regressando, assim, à esfera municipal, a gestão da água e do saneamento e de onde nunca deveria ter saído”, avisou o presidente da autarquia.

Esta decisão terá de ser aprovada em reunião de executivo e em Assembleia Municipal, onde o Partido Socialista está em maioria, mas o autarca espera que o PSD também aprove esta medida. “Esta decisão apenas poderá ser revertida caso a concessionária aceite livremente entregar a concessão ao município”, completou.

Depois de ser notificada, a Águas de Paços de Ferreira terá um prazo para entregar a concessão.

O Município diz que está pronto para gerir os serviços de água e saneamento, pondo fim a uma série de problemas existentes.  

Empresa tem de entregar serviços, mas pode pedir indemnização pelos investimentos feitos

“A decisão de avançar está tomada, não há dúvidas. A rescisão é um processo formal previsto em contrato. Notificaremos a concessionária das razões que nos assistem, e são várias. O município está devidamente fundamentado em pareceres de professores de direito. A concessionária poderá pronunciar-se e num prazo não inferior a 30 dias o município tomará a decisão final”, descreveu Humberto Brito aos jornalistas.

Questionado sobre uma possível indemnização à Águas de Paços de Ferreira, o autarca referiu que “a rescisão por justa causa não tem um valor de indemnização previsto”. Ainda assim, o contrato permite que “a concessionária possa pedir uma indemnização pelos investimentos que tenha feito e pelos quais possa ser ressarcida”. O presidente da Câmara de Paços de Ferreira sustenta que não tem toda a informação para poder antever um valor. “Do pouco que sei, conheço a dívida à banca para fazer os investimentos, que ronda os 16 milhões de euros, e foi-me referenciado um valor semelhante que terá sido supostamente o valor da aquisição”, adiantou em conferência de imprensa.

A concessão terá sido transaccionada, por duas vezes, estando agora na mão de um fundo de investimento. “A empresa nunca nos deu o devido conhecimento das transmissões e isso corresponde a uma grave violação de um dever contratual. Não há aceitável que haja sucessivas transmissões, sem se saber para quem e em que condições é que isso é feito, e que a câmara não seja chamada a pronunciar-se quando é a dona desta concessão”, sustentou Humberto Brito, falando em desrespeito pelo município de Paços de Ferreira.  

“A ser verdade os montantes de que se fala sobre os quais houve uma transacção estamos quase a falar de um crime de especulação económica perante o que a concessionária está a exigir para o reequilíbrio, o que merecia mesmo uma investigação criminal”, argumentou.

O autarca diz que tem desenvolvido contactos com várias entidades que participaram no processo dando nota da “insatisfação” da Câmara Municipal e avisando que tomariam posição sobre esta alegada transmissão da concessão. “A própria empresa é conhecedora das intenções e motivos do município”, disse.

O fim do desperdício de água para pagar menos e mais qualidade do serviço

Para o edil pacense não restam dúvidas de que uma gestão municipal dos serviços de água e saneamento terá mais-valias. “Não há outra solução”, defende.

“Não sei se vão [a concessionária] aceitar de livre vontade. Mas este é um dia histórico porque se põe fim a um problema que se arrasta há muitos anos”, sentenciou, lembrando que desde 2004, quando foi feita a concessão com a AGS Paços de Ferreira, por um período de 35 anos, ou seja, até ao ano 2039, que o concelho tem vivido “situações gravosas” para a população devido a esta privatização. “Desde logo pelos preços praticados no acesso a este bem público (taxas de ligação), por ter sido durante vários anos o concelho onde se pagava a água mais cara de Portugal (tarifário reduzido em maio de 2017 por acordo entre concedente e concessionaria), a que se soma pedidos de reequilíbrio da concessionária que ultrapassam os 150 milhões de euros”, realçou.

Com a municipalização do serviço deixarão de existir as questões que “obrigam” os pequenos comerciantes e emigrantes “a ter de desperdiçar água para não terem as taxas de saneamento pelos valores que tinham”. A autarquia também acredita que será capaz de “aumentar a qualidade do serviço”, como aconteceu com a recolha de resíduos.

Além disso, frisou Humberto Brito, “há situações em que é necessário alargar a rede e a empresa nem sempre está disponível”, e “é preciso concluir a rede de água e saneamento na freguesia de Sanfins. “Há vários anos que [a empresa] não concretiza e conclui o plano de investimentos previsto no contrato”, alega o edil.

A Câmara já iniciou o processo para internacionalização do serviço, confirmou o presidente da autarquia que quer “por fim a este processo doloroso e complexo”.

“A nossa vontade é resolver isto a bem, mas não poderemos deixar de fazer valer os direitos que nos assistem do ponto de vista jurídico”, avisou. Acredita ainda que o Partido Social Democrata vai juntar-se ao executivo socialista neste desígnio, “favorável à população”.  

O autarca pacense acredita que, perante esta decisão do município, os processos que correm em tribunal arbitral sobre o reequilíbrio deixarão de fazer sentido.

O Verdadeiro Olhar já pediu uma reacção à concessionária de águas e saneamento e aguarda resposta.