Como o próximo 31 de Dezembro é Domingo, este ano celebra-se a festa da Sagrada Família, em vez da habitual memória de S. Silvestre. Só as célebres corridas de S. Silvestre se mantêm. Quem foi este homem, que deixou uma marca tão grande e viveu há quase 2 mil anos?

As primeiras dezenas de Papas foram todos santos, vários foram mártires e, de um modo geral, os pontificados duraram menos de 10 anos. Silvestre I, foi o trigésimo terceiro Papa, também foi santo, não morreu mártir e o seu pontificado durou 20 intensos anos. Era um modesto e zeloso padre da cidade de Roma quando foi eleito e consagrado bispo da cidade no ano 314. Depois de séculos de perseguições violentas, ia começar uma era nova, justamente no pontificado de S. Silvestre.

Construíram-se as basílicas de S. Pedro e de S. João de Latrão, em Roma, a basílica do Santo Sepulcro em Jerusalém, a basílica da Natividade em Belém, e outras. Aqueles edifícios não sobreviveram até hoje, mas as actuais basílicas foram edificadas sobre os alicerces antigos.

Na época de Silvestre I, o poder imperial deslocou-se para Constantinopla, tornando Roma era uma cidade secundária na política do tempo, embora o bispo de Roma, sucessor de Pedro, continuasse a ser —até hoje— a referência universal, a quem cabia guiar toda a Igreja.

No campo teológico, S. Silvestre teve de enfrentar o cisma donatista e o arianismo. Os donatistas eram uma corrente rigorista de inspiração gnóstica, que se separou da Igreja. A heresia ariana negava que Jesus Cristo fosse «consubstancial ao Pai», isto é, que fosse propriamente Deus. A doutrina da Igreja esclareceu-se no Concílio de Niceia no ano 325, no pontificado deste Papa, reafirmada mais tarde no Concílio de Constantinopla. Ainda hoje se reza na Missa o Credo de Niceia, completado com o de Constantinopla: «Creio em um só Senhor, Jesus Cristo, Filho Unigénito de Deus, nascido do Pai antes de todos os séculos: Deus de Deus, Luz da Luz, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro; gerado, não criado, consubstancial ao Pai. Por Ele todas as coisas foram feitas».

Não é fácil entender esta frase, carregada de história. A palavra «Senhor» é uma tradução literal da palavra que os judeus usavam habitualmente para designar Deus. «Creio em um só Senhor» equivale a dizer que há um só Deus e que Jesus é Deus. A palavra «Cristo» é a tradução literal da palavra hebraica «Messias».

A expressão «Filho Unigénito de Deus» significa filho único, isto é, Jesus é Filho de Deus em sentido pleno e imediato: Deus-Pai, Deus-Filho e Deus-Espírito Santo são um só Deus. Diz-se «nascido do Pai antes de todos os séculos» para afirmar que Jesus é Deus eterno, não uma criatura, criada no tempo.

É também esse o sentido de «Deus de Deus». E por isso se acrescenta, escrevendo estes nomes em maiúscula, «Luz da Luz», em que Luz é sinónimo de Deus, e se insiste: «Deus verdadeiro de Deus verdadeiro».

A distinção «gerado, não criado» pretende explicar que as três Pessoas Divinas, Pai, Filho e Espírito Santo, têm origem na intimidade do próprio Deus, na relação mútua entre Si. O Pai é Pai em relação ao Filho, o Filho é Filho em relação ao Pai. Emprega-se a palavra «gerado»

como sinónimo de «ter origem», evitando a palavra «criação», porque Jesus é Deus, não uma criatura.

«Consubstancial ao Pai» é a tradução literal de uma expressão grega que significa «da mesma natureza», ou seja, que Jesus é Deus, tal como Deus-Pai.

A frase «por Ele todas as coisas foram feitas» sublinha que Jesus é mesmo Deus Criador, tal como Deus-Pai.

Remonta também a Silvestre I o preceito de assistir à Missa ao Domingo, que os cristãos já cumpriam, mesmo em tempo de perseguição e antes de o Imperador decretar que ninguém fosse obrigado a trabalhar ao Domingo.

O Domingo é o dia da Ressurreição de Jesus, que na mitologia romana era o dia do deus Sol. Também o Natal coincidia com o dia «Sol Invictus», o deus «Sol Invencível». São coincidências, mas lembram que Jesus é «Luz da Luz», como se diz no Credo.