José Baptista PereiraNos anos 80, para avaliar e combater os problemas ligado à pobreza, António Guterres criou o Rendimento Mínimo Garantido. Foi a resposta que encontrou para “fazer o que lhe competia como chefe do governo” como o próprio disse na altura. Nesses tempos, havia um grupo de gente empenhada em criar estruturas estatais que apoiassem as famílias que se encontravam abaixo do limiar da pobreza. Já eram muitas mas não tantas como hoje.

Guterres, socialista católico, defensor da solidariedade e coesão social, terá ficado profundamente sensibilizado apos ter participado numa conferência da Fundação Gulbenkian e criou uma comissão que estudasse o assunto para que o aconselhasse. O resultado foi a criação da legislação que garantia a todas as pessoas um rendimento mínimo que lhe permitisse viver pobre mas com dignidade. Em 1999 os economistas Carlos Farinha Rodrigues e Miguel Gouveia fazem o primeiro estudo do impacto destas medidas e concluíram que o Rendimento Mínimo Garantido tinha conseguido reduzir a intensidade da pobreza em 15%. Chegou a abranger 526 mil pessoas e ter uma dotação de 520 milhões de euros em 2009.

Seria utópico pensar que esta medida surgiu para acabar com a pobreza. O seu objetivo sempre foi o de atenuar a sua intensidade e estigma. Deve ser entendida como uma medida temporária porque é obrigação dos serviços de apoio e dos próprios beneficiários a criação de meios para garantir a reversibilidade desta situação de carência.

Apesar dos bons resultados, esta medida sempre teve os seus detratores. Sempre houve quem pensasse que o Estado não tem que ajudar quem não trabalha. É uma posição dura. Porque não têm essas pessoas acesso a um rendimento digno? Porque não têm trabalho? Porque …?.

Infelizmente, conforme fomos entrando nos anos, de 2009 em diante, o número de pessoas e famílias no limiar da pobreza foi crescendo. Entretanto o Rendimento Mínimo Garantido foi mudando de nome e de critérios de acesso. Passa a chamar-se Rendimento Social de Inserção.

O nome não interessa porque o objetivo continuava a ser o mesmo, garantir a proteção nacional dos mais carenciados e desprotegidos. Mas apesar do número crescente de famílias necessitadas, as dificuldades de aceso ao subsídio são cada vez mais restritas. A verba atribuída diminuiu de tal forma que deixou de ter significado como motor de mudança ou de estímulo para a dita inserção.

Em 2012, o governo de Passos Coelho deu a machadada final. Reduziu de tal forma a remuneração a receber por cada candidato que o rendimento de inserção passou a ser uma “pequena ajuda” para quem não tem outros rendimentos, mas não o suficiente para poder viver com dignidade.

É certo que a sociedade civil reagiu e algumas das organizações existentes, ou criadas a partir daí, tentam complementar esta falha do Estado, acompanhando e apoiando essa famílias. As próprias autarquias, apesar das suas dificuldades orçamentais, abraçaram (umas mais, outras menos) essa missão. Ainda bem que assim foi porque desta forma conseguimos conter uma autêntica catástrofe que poderia ter acontecido.

A taxa de pobreza (rendimentos abaixo de 411 euros mensais) andará atualmente pelos 20%. Sem estas medidas de apoio social, seriam cerca de 47%. Como disse o economista Farinha Rodrigues “45% dos portugueses seriam pobres mesmo trabalhando”.

Não podemos fazer de conta que esta situação não existe, porque está presente em algum lugar próximo de cada um de nós. Precisamos de conhecer os sinais tímidos que algumas das pessoas que conhecêssemos manifestam e que escondem uma situação de carência.

Se não temos disponibilidade ou vocação para uma ação direta, podemos contribuir de forma indireta, apoiando as instituições, associações, organizações ou as pessoas que fazem da aplicação da solidariedade social a sua existência.

Estou seguro que esta situação vai melhorar porque da mesma forma acredito que sairemos desta crise económica e social em menos tempo do que pensamos. Mas gente a precisar de ajuda há-de haver sempre… Sejamos solidários.