Os 113 trabalhadores da Cottonsmile – Confecções Unipessoal, Lda, empresa do grupo Polopique com uma unidade na zona industrial de Boim, em Lousada, foram surpreendidos, esta quinta-feira, com um aviso de despedimento colectivo. Com receio de que houvesse retirada de material, um grupo com cerca de 30 pessoas passou a noite à porta da empresa. Esta manhã receberam uma declaração formal que os dispensa de estar no local de trabalho e a promessa de que receberão, na segunda-feira, a carta de despedimento.

A empresa justifica o encerramento com os prejuízos sucessivos da unidade fabril. Mas garante que vai pagar os ordenados de Setembro e todos os direitos dos funcionários.

Trabalhadores apanhados de surpresa

Foi com surpresa e choque que os funcionários receberam a notícia de encerramento. Falam de uma empresa que sempre pagou a tempo e horas, não só os salários (muitos acima do salário mínimo nacional), assim como seguros de saúde, prémios, horas extras e cabazes festivos. “Não havia empresa melhor que esta”, comentavam.

Ontem, os trabalhadores estavam em laboração, a meio da produção de uma encomenda, quando lhes pediram para se preparar para receber uma auditoria. “Pediram-nos para limpar tudo e depois reuniram os trabalhadores e disseram que iam fechar porque esta fábrica dava prejuízo. Depois puseram um segurança e fecharam a porta”, explica Carla Borges.

A unidade, que produzia camisas para marcas como Zara ou Lion of Porches, abriu em Junho de 2015 e já teve cerca de 200 funcionários. Mesmo os que foi despedindo sempre receberam os seus direitos, confirmam os actuais trabalhadores a quem só falta receber os ordenados do mês em curso (Setembro), algumas horas extras e os direitos laborais por despedimento.

“Dizem que dá prejuízo desde o início, mas nós tivemos sempre muito trabalho e temos dado horas extras”, refere Filipa Costa, que trabalhava na empresa há mais de um ano. “É um choque. Nunca tinha sido despedida. Sou nova para a reforma e velha para trabalhar”, lamentava Isabel Moreira, de 53 anos, preocupada com o futuro e com a filha que também trabalhava na empresa.

Segundo confirmaram os funcionários e o Sindicato Dos Trabalhadores do Vestuário, Calçado e Cortumes, que esteve no local, a empresa deu uma carta de dispensa e a promessa de que o aviso de despedimento chegará na segunda-feira. “A empresa comprometeu-se a pagar os salários e a respeitar todas as normas”, disse Carlos Pereira, do Sindicato, referindo que não houve qualquer quebra de encomenda que justifique o fecho e que o único património da empresa Cottonsmile são os trabalhadores. “As instalações são alugadas e as máquinas são de uma terceira entidade”, afirmou.

Também a vereadora Cristina Moreira, da Câmara de Lousada, se deslocou à fábrica para falar com os trabalhadores. Prometeu acompanhar a situação e acautelar situações em que seja necessário algum apoio social. A autarquia irá também ajudar com encaminhamento para emprego futuro. “Há procura por estes trabalhadores, mas a prioridade é que sejam pagos os direitos”, salientou a autarca. A empresa não recebeu qualquer apoio para instalar-se no concelho.

Empresa garante que paga todos os direitos

Contactada, a administração da Cottonsmile esclarece que é uma empresa titular de dois estabelecimentos fabris destinados à indústria de confecção de artigos de vestuário, sendo um situado no local da sua sede social em Vizela e outro em Lousada.

“Este último estabelecimento, por causas variadas, vem revelando uma actividade deficitária permanente, acumulando sucessivos prejuízos que vão contaminando os restantes resultados da empresa”, sustenta em comunicado, salientando que apesar das tentativas nunca conseguiu inverter essa tendência.

“É, efectivamente, um caso único no vasto universo de empresas operadoras do grupo mas que se impõe diagnosticar, enfrentar e resolver, de forma corajosamente definitiva, em ordem a manter e consolidar a acentuada curva ascendente de crescimento económico e financeiro do grupo em que se insere esta empresa. Esgotadas as hipóteses de solução alternativas, não restou outra solução que não fosse avançar para o encerramento do estabelecimento de Lousada com o consequente despedimento colectivo dos seus trabalhadores”, justifica a empresa do grupo Polopique.

A administração reuniu, por isso, com os trabalhadores informando-os da decisão de despedimento colectivo. “Na reunião de 26/09/2019, naquele estabelecimento, com os trabalhadores do mesmo, foi comunicado o início ao procedimento com a presença e acompanhamento da estrutura sindical representativa dos trabalhadores do sector de actividade, em ordem a garantir que a tramitação do despedimento colectivo cumpra, integral e escrupulosamente, todas as regras procedimentais e, sobretudo, as substanciais que garantam aos seus trabalhadores o recebimento de todos os seus créditos salariais e que cumpram os demais direitos laborais”, alega a Cottonsmile, dizendo que é sensível à situação difícil criada aos trabalhadores e às famílias, pelo que vai avançar “com o integral e pronto pagamento dos seus direitos, cumprindo com todos os procedimentos para que lhes seja sempre assegurado o direito às prestações devidas pela situação de desemprego”.

Recorde-se que, em Maio, fechou também uma unidade vizinha, na zona industrial de Boim, a fábrica de calçado Sioux Portuguesa.

Encerrou sem aviso, alegando falta de encomendas e os 150 funcionários da unidade passaram duas semanas, de dia e de noite, à porta da empresa, até que o administrador de insolvência deu garantias de que todos teriam os papéis para o fundo de desemprego.