Apostar num projecto que envolvia cultura e património, como é o caso da Rota do Românico, há 20 anos atrás, exigiu coragem e arrojo dos autarcas da época. E Antonino de Sousa, actual presidente da Câmara Municipal de Penafiel, espera que os autarcas de hoje tenham a capacidade de continuar esse trabalho pioneiro, mas também apostar noutros domínios em conjunto, ainda que os resultados não surjam a curto-prazo.

Numa visita à Igreja de São Gens de Boelhe, que conhece desde a juventude, o autarca destaca a importância que a Rota do Românico assumiu na região e os visitantes que atrai aos concelhos que a integram.

Penafiel tem seis monumentos e “uma rota dentro da Rota”

“Conheço a Igreja de São Gens de Boelhe há muitos anos, desde a minha infância, porque sou natural da freguesia vizinha de Peroselo onde vivi até aos 30 anos”, descreve Antonino de Sousa.

As festas religiosas eram pretexto para conhecer o espaço, monumento classificado e um dos “mais belos” dos seis que integram a Rota do Românico no concelho de Penafiel. “É uma igreja que não é de grande dimensão, mas é de grande beleza. Tem também a singularidade de ter sido mandada construir pela neta de D. Afonso Henriques, D. Mafalda, uma memória que traz uma carga simbólica muito forte ao monumento”, acredita o autarca, apontando as assinaturas de diferentes canteiros patentes nas pedras que perduram até aos dias de hoje.

Da mesma forma que acredita que foi a relação afectuosa que a população sempre teve com o edifício religioso, que vem do início da nacionalidade, que a manteve preservada ao longo dos séculos. “A comunidade teve sempre um grande carinho pela Igreja de São Gens. Foi sempre bastante cuidada e preservada e não se cometeram aqui atentados patrimoniais que aconteceram em vários outros monumentos”, salienta.

Este e os outros monumentos do concelho de Penafiel constituem quase “uma rota dentro da Rota”, sustenta o presidente da Câmara. “Diria que podia chamar-se a rota do Tâmega dos monumentos da Rota do Românico em Penafiel”, salienta. É que a maioria dos monumentos do concelho está junto ao Tâmega.

“Temos a Igreja de São Pedro de Abragão, que é um monumento classificado, temos em Boelhe a Igreja de São Gens, continuamos depois para Cabeça Santa, para a Igreja de Gandra, um belíssimo monumento da rota, descemos até Entre-os-Rios, onde se encontra a Igreja de São Miguel, subimos e chegamos a Irivo onde encontramos o memorial da Ermida, uma peça raríssima já que há seis memoriais apenas no país, e depois, ali ao lado, está a Igreja do Salvador de Paço de Sousa, uma das joias da Rota do Românico”, descreve.

Esta proximidade permite aos visitantes conhecerem o património do concelho com pouco esforço em termos de deslocações e isso tem contribuído para “o grande número de visitantes” que o concelho tem recebido nos últimos anos. “Com o tempo os visitantes são cada vez mais porque a divulgação da Rota tem sido maior. Hoje a notoriedade e o prestígio da Rota do Românico são de facto muito substancial, quer dentro de portas quer até mesmo fora de portas”, afirma Antonino de Sousa.

Apesar de o Mosteiro do Salvador de Paço de Sousa ser “a joia da coroa” da Rota do Românico e valer por si só no que toca à atracção de visitantes, o autarca defende que é este conjunto que torna o produto turístico.

“O mosteiro tem, além da sua grandiosidade, toda uma carga emotiva e histórica. O facto de o nosso primeiro rei ter tido este contacto com Paço de Sousa, ainda que indirectamente, acaba por lhe acrescentar valor imaterial. Mas a Rota tem tido muito esse cuidado de funcionar como um todo, como um produto organizado que integra quase 60 monumentos”, argumenta.

“A verdade é que não tínhamos no nosso país, e continuamos a não ter hoje, outro projecto como este que junta o românico de uma região organizando-o e tornando-o visitável”

Antonino de Sousa acompanhou o nascimento e crescimento deste projecto cultural que assinala este ano os 10 anos de abertura ao público.

“Fui percebendo ao longo do tempo que este projecto tinha tudo para ser muito positivo e mobilizador, sobretudo no domínio do turismo”, defende. “Ainda por cima era algo de verdadeiramente inovador porque a verdade é que não tínhamos no nosso país, e continuamos a não ter hoje, outro projecto como este que junta o românico de uma região organizando-o e tornando-o visitável”, sustenta o autarca.

A recuperação dos edifícios e o investimento assegurado através de fundos comunitários foram, durante anos, a parte mais visível do projecto, mas não a mais fundamental. “Com o passar do tempo foi sendo mais percetível que a recuperação dos monumentos e das áreas envolventes era importante, mas aquilo que importava verdadeiramente era tornar a rota numa marca do nosso território e num produto turístico capaz de nos projectar, de nos promover, de nos trazer visitantes e dinâmica económica ao território”, entende o presidente da Câmara Municipal de Penafiel.

“Hoje ninguém tem dúvidas, a comunidade também o percepciona, que este é um dos projectos mais pertinentes do nosso território e que tem contribuído muito para o prestígio da nossa região e para a atracção de muitos visitantes que vão cruzando os vários concelhos que integram a Rota do Românico”, realça o penafidelense.

Este produto turístico, que já tem um grande impacto no concelho, vai ganhar mais força quando o centro interpretativo da Rota do Românico de Abragão abrir portas, algo que o autarca espera que possa acontecer até ao final do ano. “Isso vai constituir um factor relevante na dinâmica da Rota”, crê. “A presença do centro interpretativo de portas abertas, com técnicos preparados para prestar todo o tipo de informações, vai aumentar naturalmente a qualidade do produto e melhorar as condições de visitação dos monumentos. É mais um passo positivo que a Rota está a dar”, descreve.

“Quando as apostas são válidas, quando os projectos são bons os resultados acabam sempre por chegar”

Antonino de Sousa não esconde que, há 20 anos atrás, era difícil ter uma noção clara da transformação que este projecto turístico-cultural ia trazer ao território, mas era possível antever o potencial que este património representava para a região. “É obvio que não era possível antecipar que o património com esta organização e transformado num produto turístico pudesse transformar-se no caso de sucesso em que se transformou. Mas aquilo que se pretendia era isso. Que estes monumentos que estavam ao abandono, de forma solta e desarticulada, recuperados, organizados e transformados num produto turístico pudessem de facto constituir um contributo para a região”, explica.

E se, hoje em dia, “apostar no património e na cultura em geral exige coragem e arrojo por parte dos autarcas”, sendo mais tentador apostar em obras que resolvem problemas imediatos à população, o presidente da Câmara de Penafiel não tem dúvidas que os autarcas que lideraram o início da Rota do Românico, na Associação de Municípios do Vale do Sousa, foram “visionários”. “Muitas vezes os autarcas deixam-se levar pelos ciclos eleitorais em detrimento do que deve ser de facto mais importante que é um planeamento e a aposta em acções que se traduzam a médio e longo prazo na melhoria da qualidade de vida dos concidadãos e do território. Este projecto teve de facto a felicidade de ter surgido com autarcas que tiveram essa visão de longo prazo e essa capacidade de decisão para além dos ciclos eleitorais”, refere.

“Aquilo que espero é que os autarcas de hoje tenham pelo menos a capacidade de dar continuidade a esse trabalho extraordinário, a este projecto que foi de facto pioneiro e arrojado, e que possam, noutros domínios, ter essa capacidade de apostar em conjunto ainda que os resultados por vezes tardem a chegar”, defende. “Quando as apostas são válidas, quando os projectos são bons os resultados acabam sempre por chegar”, concretiza o edil.

“Os centros interpretativos são extremamente importantes e vão certamente constituir um grande contributo para a melhoria do funcionamento da Rota”

E num concelho que tem apostado no turismo nos últimos anos, como é o caso de Penafiel, a Rota do Românico é um aliado essencial nesse desígnio. “Tem sido uma alavanca muito importante na atracção de visitantes. Queremos transformar o concelho num destino turístico interessante para um tipo de visitante mais qualificado, que valoriza mais os temas da cultura, do património, da natureza”, dá como exemplo, lembrando outros atractivos do concelho, como o Museu Municipal, o Castro do Monte Mozinho ou o cais de Entre-os-Rios.

Esse aumento do volume de visitantes traduz-se em mais actividade económica, com a consequente criação de riqueza e de emprego. “Esse é um dos objectivos que perseguimos permanentemente”, salienta.

A Rota do Românico não pode agora, “descansar à sombra do sucesso que tem tido” e tem que manter a dinâmica de promoção e divulgação para continuar a crescer, defende Antonino de Sousa. “Os centros interpretativos são extremamente importantes e vão certamente constituir um grande contributo para a melhoria do funcionamento da Rota”, diz.

Por outro lado, a aposta no mercado asiático, onde há grande potencial de crescimento, pode trazer muitos visitantes.

“Este é um processo dinâmico que vai ter que estar sempre à procura dos melhores caminhos para manter o projecto vivo e apelativo. A Rota vai ter que continuar esta dinâmica que foi capaz de ter ao longo dos últimos anos para continuar a ser um projecto de sucesso”, conclui.